Fonte dos Namorados-Tabuaço
Moinho das Poldras – Tabuaço
QUEM ESPERA SEMPRE ALCANÇA
2009-05-31
Um pessimista é tentado a julgar que quem espera desespera. E, mais cedo ou mais tarde, acaba por morrer desesperado, depois de ter feito da vida um autêntico inferno, um desespero pegado.
Um optimista é impelido a entoar alegremente: quem espera sempre alcança. E muito provavelmente irá encarar a morte com uma certa tranquilidade, depois de ter vivido, ainda que em sofrimento e dor, com a arreigada esperança de que o dia de amanhã poderá correr melhor que o de hoje.
Eu sou um inveterado optimista.
Suspirei durante os muitos e longos meses em que tive de me submeter a um aturado e doloroso tratamento de quimioterapia e quejandos por ir respirar os puros e tonificantes ares do meu torrão natal. Pois no passado fim-de-semana tudo se concretizou, e muito melhor do que poderia prever. Em vez de um almoço, foram vários almoços e jantares e merendas com amigos do peito e em locais paradisíacos. No ‘refúgio’ do Joaquim Arranca (grande contador de histórias, diamante precioso a quem a vida não concedeu o mais adequado polimento, mas que mesmo assim brilha e risca como poucos) junto à ponte de feição medieval de Santa Leocádia, ao som do tamborilar das águas do rio Tedo e do chilrear alegre e prazenteiro de melros e estorninhos. Nos jardins suspensos das fragas do Moinho das Poldras do insuperável anfitrião, o velho e jovial amigo João Martinho, mais conhecido por João Feição ou ainda mais por João Matráculas (vá-se lá saber porquê!) amigo insubstituível e inseparável do meu tio Zé, até que este, no dealbar da idade adulta, emigrou para o Brasil, onde constituiu família e ainda vive e goza a juventude dos seus setenta e sete anos. Só o rio mudou de nome. Estamos agora na margem esquerda do rio Távora, com as águas a esgueirarem-se por entre pedras roliças que nós, deleitados, divisamos por entre o cortinado verde da folhagem de choupos, amieiros e freixos. O cantar saltitante das águas confunde-se também aqui com o trinar reconfortante e doce da passarada. Um mimo, este Moinho das Poldras que o João tão bem trata e preserva e a Rosa, esposa do João, nada e criada nestas paragens ao mesmo tempo inóspitas e deslumbrantes, de uma harmonia insuperável, feita de contrastes, cuida com visível e inigualável esmero, fazendo brotar, dos interstícios do árido fraguedo, luxuriante flora, à custa de esmero constante e de sobre ela baldear água erguida a pulso do açude da água que movimenta as mós. O João trata dos moinhos, dos muros, dos socalcos e da horta; a Rosa, da lida de casa e das flores. Ambos se mexem por entre aqueles degraus irregularíssimos de xisto cravado na escalvada e íngreme encosta como dois fogosos e irrequietos cabritos. No Tábua D’Aço para o almoço e o jantar de sábado. No Pinhão, em casa do Daniel Cardoso e da Teresa, filha do Joaquim Arranca e da Belmira, onde residem temporariamente por via da leucemia não-sei-quê crónica que assaltou a frágil Belmira a quem eu e principalmente o meu irmão procurámos ministrar injecções de boa disposição, optimismo e esperança. Um lauto almoço, regado com o melhor néctar do deus Baco que até hoje me foi dado provar. E refiro-me tanto ao tinto de mesa como ao vinho fino que é de fazer perder o tino e saboreá-lo até o mínimo de bom senso e amor à saúde bradarem, sobressaltados: basta. Sim, que o vinho do Douro é divinal, digno de ser degustado, mas lânguida e suavemente, e, se possível, com algum tino. Só o apelo à moderação me fez parar, quando os limites do juízo já haviam sido um tanto ultrapassados. Um tantinho, proclamo eu, em defesa do meu bom-nome e do meu estado de sanidade física e mental. Pequei. Sim, pequei. Com gosto me confesso e com vontade de repetir a dose durante muitos e bons anos. Obrigado, caros Daniel e Teresa, por tão aprazível e inolvidável repasto, pelo são convívio, para mais em comunhão com a jovialidade e o elixir da juventude dos vossos queridos filhos Daniel e Gonçalo e o regalo que é para a vista a soberba paisagem que do vosso terraço se desfruta. E como esquecer o fartote das boas cerejas e o pão-de-ló ensopado em vinho fino e o perfumado chá de tília e flor de sabugueiro que a Mercês e a Céu nos proporcionaram, enquanto íamos desfiando recordações e saudades!?
2009-06-01
Dia da xaropada, dos preparativos para a colonoscopia de amanhã, da lavagem da tripa, para melhor ser a sondagem e mais fidedigno o resultado do exame. Custa para caramba, mas tem de ser. E o que tem de ser tem muita força. Bebamos pois esta cicuta até à libertação da última porção de caca.
2009-06-02
E lá se fez a colonoscopia. Sem eu dar por nada, posto em profundo, tranquilo e sossegado sono. Foi picadela e queda. Quando acordei estava pronto para outra, com soro a entrar-me veias adentro e eu ansioso por que me fosse dada guia de levantamento e marcha, aflito para urinar. Depois de um almoço frugal, uma prolongada sessão de yoga ibérico. Quando acordei, estava mais que recuperado, ansioso por vir para aqui teclar esta meia dúzia de linhas. E cá estou eu a cantar loas à vida. Como sempre. Como quase sempre. Como sempre que posso. Como sempre que a saúde mo permite. Como sempre que a saúde mo não permite, mas eu consigo forçar a barra.
2009-05-31
Um pessimista é tentado a julgar que quem espera desespera. E, mais cedo ou mais tarde, acaba por morrer desesperado, depois de ter feito da vida um autêntico inferno, um desespero pegado.
Um optimista é impelido a entoar alegremente: quem espera sempre alcança. E muito provavelmente irá encarar a morte com uma certa tranquilidade, depois de ter vivido, ainda que em sofrimento e dor, com a arreigada esperança de que o dia de amanhã poderá correr melhor que o de hoje.
Eu sou um inveterado optimista.
Suspirei durante os muitos e longos meses em que tive de me submeter a um aturado e doloroso tratamento de quimioterapia e quejandos por ir respirar os puros e tonificantes ares do meu torrão natal. Pois no passado fim-de-semana tudo se concretizou, e muito melhor do que poderia prever. Em vez de um almoço, foram vários almoços e jantares e merendas com amigos do peito e em locais paradisíacos. No ‘refúgio’ do Joaquim Arranca (grande contador de histórias, diamante precioso a quem a vida não concedeu o mais adequado polimento, mas que mesmo assim brilha e risca como poucos) junto à ponte de feição medieval de Santa Leocádia, ao som do tamborilar das águas do rio Tedo e do chilrear alegre e prazenteiro de melros e estorninhos. Nos jardins suspensos das fragas do Moinho das Poldras do insuperável anfitrião, o velho e jovial amigo João Martinho, mais conhecido por João Feição ou ainda mais por João Matráculas (vá-se lá saber porquê!) amigo insubstituível e inseparável do meu tio Zé, até que este, no dealbar da idade adulta, emigrou para o Brasil, onde constituiu família e ainda vive e goza a juventude dos seus setenta e sete anos. Só o rio mudou de nome. Estamos agora na margem esquerda do rio Távora, com as águas a esgueirarem-se por entre pedras roliças que nós, deleitados, divisamos por entre o cortinado verde da folhagem de choupos, amieiros e freixos. O cantar saltitante das águas confunde-se também aqui com o trinar reconfortante e doce da passarada. Um mimo, este Moinho das Poldras que o João tão bem trata e preserva e a Rosa, esposa do João, nada e criada nestas paragens ao mesmo tempo inóspitas e deslumbrantes, de uma harmonia insuperável, feita de contrastes, cuida com visível e inigualável esmero, fazendo brotar, dos interstícios do árido fraguedo, luxuriante flora, à custa de esmero constante e de sobre ela baldear água erguida a pulso do açude da água que movimenta as mós. O João trata dos moinhos, dos muros, dos socalcos e da horta; a Rosa, da lida de casa e das flores. Ambos se mexem por entre aqueles degraus irregularíssimos de xisto cravado na escalvada e íngreme encosta como dois fogosos e irrequietos cabritos. No Tábua D’Aço para o almoço e o jantar de sábado. No Pinhão, em casa do Daniel Cardoso e da Teresa, filha do Joaquim Arranca e da Belmira, onde residem temporariamente por via da leucemia não-sei-quê crónica que assaltou a frágil Belmira a quem eu e principalmente o meu irmão procurámos ministrar injecções de boa disposição, optimismo e esperança. Um lauto almoço, regado com o melhor néctar do deus Baco que até hoje me foi dado provar. E refiro-me tanto ao tinto de mesa como ao vinho fino que é de fazer perder o tino e saboreá-lo até o mínimo de bom senso e amor à saúde bradarem, sobressaltados: basta. Sim, que o vinho do Douro é divinal, digno de ser degustado, mas lânguida e suavemente, e, se possível, com algum tino. Só o apelo à moderação me fez parar, quando os limites do juízo já haviam sido um tanto ultrapassados. Um tantinho, proclamo eu, em defesa do meu bom-nome e do meu estado de sanidade física e mental. Pequei. Sim, pequei. Com gosto me confesso e com vontade de repetir a dose durante muitos e bons anos. Obrigado, caros Daniel e Teresa, por tão aprazível e inolvidável repasto, pelo são convívio, para mais em comunhão com a jovialidade e o elixir da juventude dos vossos queridos filhos Daniel e Gonçalo e o regalo que é para a vista a soberba paisagem que do vosso terraço se desfruta. E como esquecer o fartote das boas cerejas e o pão-de-ló ensopado em vinho fino e o perfumado chá de tília e flor de sabugueiro que a Mercês e a Céu nos proporcionaram, enquanto íamos desfiando recordações e saudades!?
2009-06-01
Dia da xaropada, dos preparativos para a colonoscopia de amanhã, da lavagem da tripa, para melhor ser a sondagem e mais fidedigno o resultado do exame. Custa para caramba, mas tem de ser. E o que tem de ser tem muita força. Bebamos pois esta cicuta até à libertação da última porção de caca.
2009-06-02
E lá se fez a colonoscopia. Sem eu dar por nada, posto em profundo, tranquilo e sossegado sono. Foi picadela e queda. Quando acordei estava pronto para outra, com soro a entrar-me veias adentro e eu ansioso por que me fosse dada guia de levantamento e marcha, aflito para urinar. Depois de um almoço frugal, uma prolongada sessão de yoga ibérico. Quando acordei, estava mais que recuperado, ansioso por vir para aqui teclar esta meia dúzia de linhas. E cá estou eu a cantar loas à vida. Como sempre. Como quase sempre. Como sempre que posso. Como sempre que a saúde mo permite. Como sempre que a saúde mo não permite, mas eu consigo forçar a barra.
8 Comentários:
Às 13 de junho de 2009 às 12:03 , Branca disse...
Olá André,
Cá consegi entrar, depois de uma tentativa frustrada ontem à noite.
FIquei deliciada com esta descrição da viagem a Tabuaço, com as belas fotografias. O André está com um óptimo aspecto, o Osvaldo como sempre com aquele sorriso generoso e brilhante e na primeira creio que é o seu irmão que o acompanha e que tive prazer de conhecer.
Fala da sua terra com tanto entusiasmo, que me aguçou o apetite para a ir conhecer, até porque agora falo para lá frequentemente via telefone, por motivos profissionais.
Faz muito bem ser optimista, é dos meus, sou teimosamente optimista, mas força como a sua é admirável e única.
Já encaminhei o convite a todos os meus contactos, alguns se calhar repeti, mas nunca é demais.
Deixo-lhe beijinhos.
Branca
Às 14 de junho de 2009 às 01:25 , Andre Moa disse...
Cara Branca,
obrigado pelas gostosas referências quer às pessoas, quer à terra.
Aguçar o apetite é comigo. Satisfazê-lo é que é mais difícil.
OBRIGADO PELA DIVULGAÇÃO.
O que não será se um dia se vier a realizar um lançamento no Porto!
Beijinhos.
André Moa
Às 18 de junho de 2009 às 13:27 , Elvira Carvalho disse...
Um passeio de fazer inveja a qualquer um.
Que o possa repetir muitas vezes são os meus desejos.
Um abraço
Às 18 de junho de 2009 às 22:23 , Andre Moa disse...
Um abraço, cara Elvira.
Vou voltar a Tabuaço no último fim-de-semana deste mês, se não aos mesmos locais a outros igualmente paradisíacos.
Beijinhos.
André Moa
Às 19 de junho de 2009 às 00:11 , sideny disse...
Recebi um convite para o seu lançamento do livro.
Espero conseguir ir.
Desejo-te as melhoras, e tudo de bom para si.
Abraço
Às 19 de junho de 2009 às 23:50 , Andre Moa disse...
Ainda bem que recebeste o convite ed esperas conseguir ir. Aliás, todos os visitantes deste blogue estão, ipso facto, convidados. Foi para isso que publiquei aqui o convite, há dias.
Um abraço.
André Moa
Às 25 de junho de 2009 às 23:58 , Branca disse...
André,
Tenho ficado muito feliz com as notícias que me chegam do lançamento do livro, um êxito! Espero que o mesmo chegue breve a algumas livrarias do Porto, diga-me quais ou se realmente está programada alguma apresentação para mais tarde nesta cidade.
Baralhada vim cá a 23 para lhe desejar sorte, antes de ir para o S. João, depois lembrei-me a meio que era a 24, no dia de S. João e não na véspera, entretanto com as festas em família acabei por passar já tarde, estaria o André no evento, mas venho agora desejar a continuação de muito êxito.
Estou com os olhos em bico com o programa do Osvaldo para Tabuaço, em Setembro, vou fazer tudo para estar presente, espero que vá.
Beijinho grande
Branca
Às 26 de junho de 2009 às 00:47 , Andre Moa disse...
Cara Branca,
Foi de facto um êxito, o lançamento do livro. Estamos todos de parabéns.
O livro já deve estar à venda no Porto, como já está em todo o país, em tudo o que é Fnac, Bertrand e outras livrarias que não tenham calotes para com a editora.
Por enquanto nada está programado para o Porto. Por certo, a acontecer,como gostaria, só depois do Verão, penso eu.
Vou fazer os possíveis e os impossíveis para estar em Tabuaço, claro. Mas não vai ser nada fácil.
Beijinhos.
André Moa
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