AOS SETENTA só SESSENTA DE POESIA - 4



(Uma vez que o Natal, o Réveillon e os Reis já se foram e d(Eu)s e a Carolina já demos o que tínhamos a dar, volto à antologia biobibliográfica)
AOS SETENTA só SESSENTA DE POESIA
(continuação)
AOS SETENTA só SESSENTA DE POESIA
(continuação)
3
Uma vez livre como um passarinho, ainda que ferido no peito e de asas rentes, não tardou que a espevitadora seta do Cupido fizesse brotar de novo o fio poético que cedo em mim se revelara.
Bela flor, onde é que moras?
Em que jardim te encontrar?
Anda, fala-me, meu anjo!
Toda minha hás-de ficar.
Ris? Injurias-me assim?
Isso é riso suave
Saído do amor por mim.
Fico ansioso, meu anjo.
Isto causa-me ciúmes,
Lacero o meu coração
Olhando o amor pelos cumes.
Meu amor idolatrado,
Em que pensas quando vês
Nos meus olhos dor, filtrado
Amor que a ti se fez?
Em que é que ela havia de pensar, perante tamanha pepineira babosa, fruto da minha imaturidade e paralisante timidez que só muito assolada pela musa inspiradora se atreveu a revelar-se? Por certo em tudo e em todos menos em mim. Tudo se esfumou naquela para mim inolvidável tarde de estudo em grupo, restando, porém, uma amizade e um respeito profundos, como viemos a verificar ultimamente, de há uns sete, oito anos a esta parte, depois de quarenta e muitos sem sabermos nada um do outro.
A minha primeiríssima musa teve há meses, agora que conta, como eu, setenta anos de idade, um AVC que a deixou muito diminuída. Com mais fervor aqui lhe presto homenagem e lhe devoto todo o meu preito.
Este o rastilho que fez de mim o lírico da turma, o pinga-amor envergonhado, só na poesia e através da poesia ousado. Poucas colegas terão escapado (a seu pedido, será bom frisá-lo) a uma manifestação de ternura, de amor assolapado, timidamente revelado em meia dúzia de versos pespegados no frontispício da selecta literária de cada uma delas.
Mas destas manifestações mais lamechas que poéticas não guardo registo, nem sequer na memória. É muito provável que uma ou outra tenha conservado, à mistura com os demais livros, a famigerada selecta onde verti a ousadia poética de um adolescente poetastro. Cinquenta e tal anos depois, para mais depois da catástrofe desaglutinadora da diáspora migratória que quase todos sofremos, não sabendo eu, ainda hoje, do paradeiro da maioria, nem tento procurar algum resquício dessa laboriosa época “literária”. E para quê? Para ir por lã e sair tosquiado? Para ir por uns versinhos, umas quadras, uns sonetos, e ser escorraçado? Para causar aos setenta anos alguma crise de ciúmes serôdios e inconsequentes nos seus respeitados cônjuges? Nem pensar! Trabalheiras, para mais infrutíferas, quando não perturbadoras da paz das nossas pacificadas almas, quanto mais não seja pelo decorrer do tempo? E para quê? Para recolher um ou outro fragmento de um testemunho de fraco impacto, de duvidosa qualidade poética? Nã! Nessa não caio. Prefiro continuar envolto na deleitosa nebulosidade desses longínquos dias que tanto prometeram. A obra posterior que fale por si de tal promessa.
Uma vez livre como um passarinho, ainda que ferido no peito e de asas rentes, não tardou que a espevitadora seta do Cupido fizesse brotar de novo o fio poético que cedo em mim se revelara.
Bela flor, onde é que moras?
Em que jardim te encontrar?
Anda, fala-me, meu anjo!
Toda minha hás-de ficar.
Ris? Injurias-me assim?
Isso é riso suave
Saído do amor por mim.
Fico ansioso, meu anjo.
Isto causa-me ciúmes,
Lacero o meu coração
Olhando o amor pelos cumes.
Meu amor idolatrado,
Em que pensas quando vês
Nos meus olhos dor, filtrado
Amor que a ti se fez?
Em que é que ela havia de pensar, perante tamanha pepineira babosa, fruto da minha imaturidade e paralisante timidez que só muito assolada pela musa inspiradora se atreveu a revelar-se? Por certo em tudo e em todos menos em mim. Tudo se esfumou naquela para mim inolvidável tarde de estudo em grupo, restando, porém, uma amizade e um respeito profundos, como viemos a verificar ultimamente, de há uns sete, oito anos a esta parte, depois de quarenta e muitos sem sabermos nada um do outro.
A minha primeiríssima musa teve há meses, agora que conta, como eu, setenta anos de idade, um AVC que a deixou muito diminuída. Com mais fervor aqui lhe presto homenagem e lhe devoto todo o meu preito.
Este o rastilho que fez de mim o lírico da turma, o pinga-amor envergonhado, só na poesia e através da poesia ousado. Poucas colegas terão escapado (a seu pedido, será bom frisá-lo) a uma manifestação de ternura, de amor assolapado, timidamente revelado em meia dúzia de versos pespegados no frontispício da selecta literária de cada uma delas.
Mas destas manifestações mais lamechas que poéticas não guardo registo, nem sequer na memória. É muito provável que uma ou outra tenha conservado, à mistura com os demais livros, a famigerada selecta onde verti a ousadia poética de um adolescente poetastro. Cinquenta e tal anos depois, para mais depois da catástrofe desaglutinadora da diáspora migratória que quase todos sofremos, não sabendo eu, ainda hoje, do paradeiro da maioria, nem tento procurar algum resquício dessa laboriosa época “literária”. E para quê? Para ir por lã e sair tosquiado? Para ir por uns versinhos, umas quadras, uns sonetos, e ser escorraçado? Para causar aos setenta anos alguma crise de ciúmes serôdios e inconsequentes nos seus respeitados cônjuges? Nem pensar! Trabalheiras, para mais infrutíferas, quando não perturbadoras da paz das nossas pacificadas almas, quanto mais não seja pelo decorrer do tempo? E para quê? Para recolher um ou outro fragmento de um testemunho de fraco impacto, de duvidosa qualidade poética? Nã! Nessa não caio. Prefiro continuar envolto na deleitosa nebulosidade desses longínquos dias que tanto prometeram. A obra posterior que fale por si de tal promessa.