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DIÁRIO DE UM PACIENTE II

domingo, 30 de maio de 2010

CRÓNICAS NO FEMININO
















CANETA DE TINTA PERMANENTE
No alto da colina, o edifício mantém-se. A diferença é que antes não existia a aveni­da rasgada de alto a baixo, fruto da teimosia de uma mulher (das poucas que após Abril passaram a governar autarquias) contra a vontade de al­guns, provincianamente agarrados à pequenez do seu mundo. Outra diferença ainda é que há muito deixou de existir a separação entre os gé­neros. Os dois blocos – masculino e feminino – modelo padronizado das escolas do Estado Novo, con­tinuam de pé, se bem que as aulas e o recreio não sejam já determinados pelas linhas anatómicas de quem os frequenta. Tempos de mudança que a minha avançada idade aplaude, mas não me impede de viajar pelo pas­sado longínquo de menino pobre.
Insisto em lembrar caras de colegas, mas não consigo; elas esfumam-se na neblina que apaga os nomes sem rosto, escritos no rectângulo negro da lousa, de cada vez que o professor faz a chamada. Ficou apenas um: de traço fino, bem delineado, tez clara, cabelo aparado, bata impecavelmente branca e botas (luxo de poucos), que lhe aqueciam os pés. Tinha um ar frágil, como quase todos os meninos cria­dos com as mordomias das famílias abastadas. Não se embrulhava em brigas, não rebolava pelo chão, não arranhava os joelhos no pó da terra, porque tinha de chegar a casa com o mesmo ar com que tinha saído – o cheiro a limpo e a franja moldada pela camada de brilhantina. Não o invejávamos no recreio, porque lhe eram vedadas todas as brincadeiras que descambassem no desalinho da sua figura de manequim. No entanto, dentro da sala de aulas, ele possuía o brinquedo mais cobiçado por to­dos – uma caneta de tinta perma­nente. Enquanto nós arranhávamos as palavras e os números, por força de um aparo que há muito havia ul­trapassado o prazo de validade, ele comprazia-se em fazer deslizar, so­bre a folha pautada do caderno, a sua caneta de tinta permanente. E nós ficávamos pasmados a olhar para aquela maravilha que não pre­cisava de, constantemente, mergulhar no tinteiro do tampo da carteira, para se reabastecer de autonomia para mais uma cópia ou uma série de operações aritméticas. Ele escre­via e olhava-nos de soslaio, porque, no enviesado do seu olhar, percebia o desejo mal disfarçado que todos tínhamos de lhe pedir emprestado o objecto dos nossos sonhos. Até os exercícios de caligrafia ficavam mais bonitos! Pudera... ele não precisava de interromper o curso de nenhuma das hastes porque, no ventre da sua caneta, havia um êmbolo de borra­cha que guardava o suficiente para horas de trabalho.
Um dia descobri a solução. O que me faltava em riqueza, sobrava-me em rapidez e agilidade mental. Propus-lhe um negócio: ele em­prestava-me a caneta por uns minu­tos e eu fazia-lhe os trabalhos de casa. E assim mantivemos esta cum­plicidade de um comércio vivido na clandestinidade de outros olhares.
De cada vez que olho para o meu velho e desbotado diploma do ensino elementar, o jovem aprumado da Mocidade Portuguesa que, do lado esquerdo segura o estandarte, faz-me sempre lembrar o menino da caneta de tinta permanente – um aprumo prenhe de orgulho, por força de uma diferença que lhe alimenta as entranhas.
AIDA BAPTISTA

Apontamentos anticancro 10

«Antes de roçarmos a mortalidade, a vida parece-nos infinita, e preferimos manter esta perspectiva. Parece que nunca nos faltará tempo para irmos em busca da felicidade. Primeiro, tenho de acabar o curso, pagar os empréstimos, criar os meus filhos, reformar-me… mais tarde hei-de preocupar-me com a felicidade. Quando deixamos para amanhã a procura do essencial, podemos deixar a vida escapar-nos por entre os dedos sem sequer a termos saboreado.
Por vezes, o cancro cura esta estranha miopia, esta dança de hesitações. Ao expor a brevidade da vida, um diagnóstico de cancro pode restituir à vida o seu verdadeiro sabor.»
Do livro «Anticancro – um novo estilo de vida» de David Servan-Schreiber.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

CICLO REFLEXÃO



LOUCA CAVALGADA

Anda, meu amor,
Percorrer o mundo em cavalgada louca,
Descobrir o encanto do momento,
Trepar ao alto da montanha
E ver o invisível,
Sentir o toque de beleza
Em nossas almas enlaçadas
E em nossos corações em união,
Para além de tudo, para além da morte,
Porque só morre o que é mortal
E o nosso amor não é mortal.
Anda, meu amor,
Sentir a brisa afagar os nossos rostos
Como mão de mãe a acariciar os filhos,
Ouvir o murmurar que ninguém ouve
E o cântico dos que não sabem cantar.
Anda, meu amor,
Vamos caminhar, sorrir e gargalhar
Sempre juntos.
Afogar a dor de todo o Mundo
Dos atormentados e dos aflitos,
Com o nosso amor imenso
Como bálsamo infinito.
Vamos correr juntos,
Correr sempre.
Anda, meu amor.
PAIXÃO LIMA

Quem te disse que o amor
Afoga do mundo a dor
E abafa qualquer grito?
Quem te convida a correr
E te acena, se doer,
Com um bálsamo infinito?

Quem te dá cabo dos untos,
Te convida a correr juntos
Sempre, sempre, sem parar?
Quem te diz que és imortal,
Te livra de todo o mal
E passa a vida a cantar?

Quem te disse para voar,
Loucamente cavalgar
Por mundos que nunca vi,
Trepar montes no inverno,
Descer ao vale do inferno?
Foi a paixão? Logo vi!

Cuidado com o que ela diz!
Ninguém pode ser feliz
Toda a vida sem revezes.
E não será ilusão
Unir alma e coração,
Como se fossem siameses?

A paixão é labareda.
Queima a vida que nem meda
De palha em pleno Verão.
Se quiseres fugir da dor,
Não te queimes, meu amor,
Na fogueira da paixão.

André Moa

BOLETIM DE SAÚDE
Fiz na segunda-feira novas análises ao sangue e à urina. Levantei-as ontem e fui mostrá-las ao oncologista. O maroto do marcador antigénio carcinoembrionário (CEA) não pára de trepar. Desta vez deu um salto de cavalo. De 34 e pouco subiu para 49,39 ug/L. Apesar disso, por me sentir bem e os demais parâmetros se situarem dentro ou próximos da normalidade, e atendendo ao período de férias que não tarda, continuarei entregue a mim próprio e aos tratamentos naturistas que pretendo continuar a seguir, até Setembro. Então se verá. Espero que até lá o organismo reaja e supere a teimosia do senhor cancro, para que me possa proclamar o vencedor da guerra que travamos leal e afincadamente há quatro anos.

André Moa


Apontamentos anticancro 9

«Quando soube que tinha um tumor no cérebro, descobri, da noite para o dia, um mundo que me parecia familiar, mas que, na realidade, eu conhecia muito mal – o mundo do paciente. Despojado dos meus atributos profissionais, passei a pertencer à “classe” dos simples pacientes. Senti o chão a fugir-me debaixo dos pés. Entrei num mundo incolor: um mundo em que as pessoas não tinham qualificações, nem profissão. Um mundo no qual ninguém estava interessado naquilo que fazemos na vida ou naquilo que nos possa passar pela cabeça. Muitas vezes, a única coisa que temos interessante é a última radiografia que fizemos. Apercebi-me de que a maior parte dos meus médicos não sabia tratar-me como paciente e colega simultaneamente. De repente, tive a sensação de que havia um “clube dos vivos” e eu era informado de que não era membro. Comecei a ter receio de pertencer a uma categoria à parte, uma categoria de pessoas definidas essencialmente pela sua doença. Tive medo de me tornar invisível. Medo de deixar de existir antes de morrer. Mesmo que eu estivesse às portas da morte, queria viver plenamente até ao fim. Fiquei consternado. A maioria das pessoas parecia achar que quem está gravemente doente não pode dar uma boa gargalhada. A partir desse dia, e para o resto da minha vida, eu carregaria o estigma de uma pessoa condenada a morrer».
Do livro «Anticancro – um novo estilo de vida» de David Servan-Schreiber.

Comentário – E como tudo isto é verdade, vistas as coisas pelo prisma do paciente!
André Moa

quarta-feira, 26 de maio de 2010

UMA VIDA EM VERSOS


AOS SETENTA só SESSENTA DE POESIA
ANTOLOGIA DE UM DESCONHECIDO
Edição 1973
(continuação)

POEMAS INDEFINIDOS
(conclusão)

REDOMÃO
[1]

em português brasileiro
redomão é
cavalo novo que já foi montado
algumas vezes para se amansar

em português lusitano
cavalo
novo ou velho
macho ou égua
escanzelado
à força de ser amansado
e sempre montado
não se diz
redomão

pois não

A DESGRAÇA E A OUTRA FACE
OU
O MEDALHÃO DA EXISTÊNCIA

anverso - desgraça
reverso - esperança
mendigo na praça
a sonhar-se criança

SUBJECTIVAMENTE JÁ FUI MORTO

quando me dói a cabeça
tenho sempre a sensação
que o mundo vai acabar

se é a alma que me dói
o mundo acaba mesmo

GRITO CALADO
dobram sinos
pressentidos

morto sou

olhos choram
improváveis aleluias

vivo sou

asas riscam
mares e céus
no plano levitado
do meu corpo

pássaro sou

rios passam
rios cantam
por mim passam
em mim cantam

boca sou

no meu peito
grito e calo
cio e dores

homem sou

MOEDA FALSA
rico e crava
figueira brava
judas pendura
o pobre cava
e como é brava
sua amargura

DO MAL O MENOS
OU
O QUE CADA QUAL SENTE E DIZ SE SENTISSE E DISSESSE

o nascituro haja luz
o aborto haja alívio
o recém-nascido haja ar
o nado-morto haja limbo
o nado-pobre haja pão
o nado-rico haja “grão”
o impoluto haja paz
o incorrupto haja amor
o made in Portugal haja haver
o são haja vida
o enfermo haja saúde
o moribundo haja outras vidas
o morto haja o que houver
o vivo haja o direito de viver

DECLINAÇÃO

bobos na corte

lobos na corte

pobre res
rei

pobre coisa

ai de nós


Apontamentos anticancro 8

«O confronto com a doença é uma experiência interior que deixa marcas profundas. As estatísticas que nos apresentam sobre a sobrevivência ao cancro não fazem distinção entre as pessoas que se contentam em aceitar passivamente o veredicto médico e aquelas que mobilizam as suas próprias defesas naturais. Dentro da mesma “média”, incluem-se aqueles que continuam a fumar, a expor-se a outras substâncias cancerígenas, que fazem uma alimentação tipicamente ocidental – um fertilizante para o cancro – que continuam a fragilizar o seu sistema imunitário com demasiado stress e pouco controlo sobre as emoções, ou que se esquecem do próprio corpo privando-o de actividade física. E, dentro desta “média”, há aqueles que vivem muito mais tempo. Isto deve-se, provavelmente, ao facto de terem galvanizado as suas defesas naturais ao mesmo tempo que eram submetidos a tratamentos convencionais. Encontraram harmonia graças a este simples quarteto: desintoxicação de substâncias cancerígenas, alimentação anti-cancro, actividade física adequada e busca de paz de espírito.
Não existem métodos naturais capazes de curar o cancro. Mas também não existe fatalidade. O melhor caminho é aprendermos a usar os recursos do nossos organismo para vivermos uma vida mais longa e mais rica.
Em chinês a ideia de “crise” é escrita com a combinação de dois caracteres: “perigo” e “oportunidade”. O efeito ameaçador do cancro cega-nos; torna-se difícil para nós alcançar o seu potencial criativo. Em muitos aspectos, a minha doença mudou a minha vida para melhor, de uma maneira que eu nunca poderia ter imaginado quando pensava que estava condenado».
Do livro «Anticancro – um novo estilo de vida» de David Servan-Schreiber.
Nota: soube ontem pelo Kim que o autor deste livro esteve em Portugal. Hoje deparei com uma pequena entrevista dele na revista Visão, onde resume a sua História clínica e a forma de combater o cancro, que ele expande neste seu livro de que estou a transcrever para aqui algumas passagens. André Moa
[1] Redomão (do cast. Redómon), s.m. (bras.)

segunda-feira, 24 de maio de 2010

CICLO EMOÇÃO



MULHER BENDITA!

Houve quem fosse Rainha
Depois da morte!
Tu é-lo na vida
Mulher brejeira,
Amada com cegueira
E nunca comprometida!
És tu somente...
A minha Querida
Das noites cálidas,
Dos dias sem horas!
E porque demoras
Na confiança eterna
No Ernesto,
Que, de resto,
É bem como tu:
Selvagem, erótico, errante,
Com olhos que só olham
Para diante
Ao encontro dos teus,
Que são meus,
Porque outros, muitos, quase todos
São ateus
Dos teus silêncios risonhos
Que só eu entendo;
Minha Querida,
Criação esmerada da Natureza,
Minha Princesa, Minha Rainha
Do meu reino encantado,
Onde continuo a sonhar, a amar
E a ser amado;
Vai em frente com coragem
Deixando os tabús, as falsas morais
Aos outros que não te merecem...
E sempre que tentarem
Que deixes de ser tu
Para seres igual a eles,
Incendeia-os
Com os teus lindos olhos
De orgasmo
E masturba-te no entusiasmo
De amares só quem queres
Em pleno...
Refugia-te neste teu irmão de alma;
Ao meu lado, fecha os olhos
Devagar, com calma,
E dorme um sono sereno!
Ernesto Leandro

Apontamentos anticancro 7
«Durante 15 anos mantive ferozmente em segredo a minha doença. Adoro o meu trabalho de neuropsiquiatria e nunca quis que os meus pacientes sentissem que tinham de cuidar de mim em vez de ser eu a ajudá-los. Também não quis, enquanto investigador e professor, que as minhas ideias e opiniões fossem encaradas como o fruto da minha experiência pessoal e não a abordagem científica por que sempre me guiei. Do meu ponto de vista pessoal, tal como compreendem todos os que têm um cancro, queria ser capaz de continuar a viver, a 100%, entre os vivos. Actualmente, não é sem alguma apreensão que decido falar no assunto. Mas estou convencido de que é importante tornar disponível a informação que obtive para quem possa querer pô-la em prática.
A primeira parte deste livro apresenta uma nova perspectiva dos mecanismos do cancro. Esta perspectiva baseia-se no funcionamento fundamental, mas ainda pouco conhecido, do sistema imunitário, na descoberta de mecanismos inflamatórios subjacentes ao crescimento de tumores e na possibilidade de bloquear a sua propagação impedindo que sejam alimentados por novos vasos sanguíneos. A esta nova perspectiva da doença seguem quatro novas abordagens. Qualquer um pode pô-las em prática e envolver o corpo e a mente na criação da sua própria biologia anti-cancro: 1- como proteger-nos dos desequilíbrios do meio ambiente; 2- como adaptar a nossa alimentação de modo a eliminar promotores de cancro e a incluir o maior número possível de componentes fitoquímicos que combatem activamente os tumores; 3- como reconhecer e curar as feridas psicológicas que alimentam os mecanismos biológicos de desenvolvimento do cancro; 4- como criar um relacionamento com o nosso corpo que estim
ule o sistema imunitário e reduza a inflamação causadora de desenvolvimento de tumores».
[1]
Do livro «Anticancro – um novo estilo de vida» de David Servan-Schreiber.

[1] É este tipo de abordagem que estou a fazer há um ano, com tenacidade e aparentemente com bons resultados. Digo aparentemente porque me sinto benzinho, não obstante os tumores e os marcadores cancerígenos continuarem a aumentar, quiçá mais lentamente do que se não seguisse este tratamento. André Moa

sábado, 22 de maio de 2010

CICLO PAIXÃO




A MENINA CONTRAPESO
O antivírus Comodo que havia instalado no meu computador a conselho de um sábio pouco sabichão estava a revelar-se um verdadeiro fiasco. Não fazendo parte da solução, como seria suposto, estava a constituir um problema. Com frequência, a sua arrogante e impertinente aparição bloqueava completamente o computador. Encontrando-me a meio caminho, obrigava-me, pela sua incompetência, a voltar ao princípio. Era o liga, desliga e volta a ligar o computador. Perdi a paciência que nunca foi muita, pois sempre entendi que a paciência era mais adequada aos pacientes. Assim, resolvi matar o mal pela raiz. Num gesto desabrido, desliguei os cordões umbilicais que ligavam o computador à energia mãe, o que não foi nada fácil dada a confusão de fios. Abraçado à caixa da sabedoria, lá vou eu, a butes, ao médico dos computadores. Não foi nada fácil a empreitada. Fiquei a conhecer, na prática, que a sabedoria tem peso, e pesa muito.
Nas curvas e contracurvas do centro comercial, por peso a mais ou força a menos, era obrigado a parar, de trinta em trinta metros (mais palmo, menos palmo), para distribuir o peso da caixa de lata, do braço direito para o esquerdo, e vice-versa. A meio do trajecto, sai-me ao caminho, uma jovem alta e muito magra, género Olívia Palito, a oferecer ajuda que, delicadamente recusei. Mas a jovem insiste. Com o seu olhar condoído, de quem olha para um infeliz carregador de fardos pesados, prestes a sucumbir, murmura na sua vozinha de pedinte: - Eu ajudo! E segue pressurosa os meus passos, sempre a lamuriar. Como se não me bastasse ter de transportar uma carga pesada como os meus pecados que são efectivamente pesados, ainda ter de lidar, para atrapalhar, com a Olívia. Assim, resolvo parar, mais por necessidade física que outra coisa. E pergunto-lhe, afavelmente: - A menina pertence aos escuteiros? Não! Responde, ingenuamente. Olhe, minha amiga, agradeço o seu cuidado e atenção, mas não preciso de ajuda. Respondo, ao mesmo tempo que procuro recuperar o fôlego perdido. Mas porquê?! Insiste ela. Algo impaciente, respondo-lhe sorridente: - Por uma razão simples, minha amiguinha. Esta caixa já é demasiada pesada para carregar. Agora acrescente a este peso mais o peso da minha amiga. Não acha que é carga a mais para a minha camioneta? - Não compreendo. - Responde desiludida. Fica especada e confusa no corredor. Ao afastar-me, ouço perfeitamente o ranger de correntes e o estalar de parafusos sob pressão da sua cabecinha pensadora.
Moral da história: - A juventude é generosa, mas nem sempre tem força.
Paixão Lima
Apontamentos anticancro 6
«Deve ficar desde já esclarecido que, actualmente, não existe qualquer método alternativo para curar o cancro. É completamente insensato tentar curar esta doença sem recorrer aos melhores métodos da medicina convencional ocidental: a cirurgia, a quimioterapia, a radioterapia, a imunoterapia e, em breve, a genética molecular.
Do mesmo modo, é completamente insensato confiar apenas nesta abordagem puramente técnica e menosprezar a capacidade natural do nosso organismo de se proteger de tumores. Podemos tirar partido desta protecção natural tanto para prevenir a doença como para aumentar os benefícios dos tratamentos.
Nestas páginas, vou contar-lhes a história de como deixei de ser um investigador científico totalmente desconhecedor das defesas naturais do organismo, para me tornar um médico que conta, acima de tudo, com estes mecanismos naturais. O meu cancro ajudou-me a realizar esta mudança».
[1]
Do livro «Anticancro – um novo estilo de vida» de David Servan-Schreiber.

[1] O meu também me ajudou a confiar nas defesas naturais, a preservá-las e a fazer tudo para aumentá-las, depois de me ter submetido a intervenção cirúrgica, radioterapia e quimioterapia. E a saga continua. Foi nesta busca constante que “descobri” este livro que estou a ler e a transcrever, parcialmente, aqui. André Moa

quinta-feira, 20 de maio de 2010

CRÓNICAS NO FEMININO

Jardim Zen
É O FIM DA MACACADA

Ofereceram-lhe uma caixa pelo Natal. Na parte inferior, e por baixo de uma imagem de ondas de areia, lia-se Jardim Zen. Ela não tinha a menor ideia do que se tratava. Abriu a caixa e viu lá dentro um tabuleiro com um quadrado saliente no meio, deixando a toda à volta um espaço livre de uma mão-travessa. Dentro de um saco plástico, areia branca; noutro, pequenos seixos rolados; embrulhado num plástico almofadado, um pequeno pote de cerâmica com elementos decorativos orientais em relevo; disposto na horizontal e bem disfarçado, por baixo das pedras e do saco de areia, um ancinho de madeira.
Continuava sem perceber. Foi-lhe, então, explicado o sentido que aquele conjunto de objectos fazia - libertar o stress! Como? Espalhava-se a areia na base do tabuleiro, dispunham-se os seixos aqui e ali, com o ancinho desenhavam-se livremente na areia caminhos por onde se deveria escorrer a ansiedade.
Ela sempre a questionar-se sobre a hora do dia a que poderia entregar-se àquele deleite de não ter um dever para cumprir. Com um sorriso carregado de ironia, foi precisamente essa a pergunta que fez ao amigo que lhe providenciara a oferta. «A que horas é que eu posso brincar com isso?». Ele sugeriu-lhe que o colocasse junto ao telefone. Que sim que resultava, porque enquanto segurava o auscultador com a mão esquerda, podia perfeitamente mexer na areia com a direita.
Entre a marcação de uma reunião, encomenda de uma pizza, alteração de uma consulta médica, um grito ao filho para que se despache no banho, um olá de felicitações a mais um aniversariante e tantos outros diálogos de ocasião, há um jantar que se prepara, uma mesa que se põe, uma máquina de lavar roupa que se programa, num cumprimento de rotinas sem tempo nem espaço para qualquer jardim Zen que se queira intrometer na azáfama do quotidiano.
Nos momentos de maior congestionamento de afazeres, é o papel que lhe serve de jardim Zen, enquanto a caneta lhe massaja os dedos deixando escapar a tensão por entre linhas traçadas ao acaso. Habituou-se, desde muito cedo, a fazer estes desenhos como se a sua mão simplesmente deslizasse sem querer. E os riscos sobrepunham-se, ganhando umas vezes formas angulosas, outras mais arredondadas, intersectando-se nos encontros de ocasião. Surpreendia-se, muitas vezes, com o resultado e pensava que se acrescentasse um toque aqui e ali, uma oblíqua ou perpendicular no conjunto das formas desenhadas, obteria aproximações a muitos dos quadros que já vira expostos em galerias de renome.
Naquele dia, porém, tudo foi diferente. Enquanto falava, o desenho tomou conta da sua mão. E foi aparecendo de forma natural em quadrículas arrancadas às folhas da sua infância longínqua. Primeiro, dois quadrados geminados. Logo abaixo da linha divisória, um quadrado suspenso e apostado na simetria do desenho perpendicular. Depois, outro dueto de quadrados geminados, de forma a que se obtivesse uma figura rectangular igual à primeira. E a mão continuava, numa sequência de mais três quadrados, rematados por um semicírculo. Nesta redoma final, desenhou três figuras sem rosto, sem nome, apenas gente. Gente com quem queria brincar. Colocou-lhes na mão uma pedra. Ah... lembrou-se, não podia ser uma pedra qualquer, mas uma pedra espalmada, daquelas que avançam rente ao chão com uma ligeira pancada do pé. Pouco de cada vez, de modo a percorrer todo o quadriculado do jogo, sem ultrapassar as fronteiras das linhas desenhadas. Começava-se pela primeira casa e, sempre a pé coxinho, dava-se a volta completa empurrando a pedra na ponta do pé. No caso, na ponta da mão, porque foi com a mão que pôs todos os amigos à vez a jogar até chegar a sua. No equilíbrio precário de quem não quer perder, empurrou-os de casa em casa sem fazer batota. Jogou-o o tempo que duraram os telefonemas e virou costas ao protesto de quem achou mal que não se tivesse concluído a série. o jogo da macaca
Chamava-se o jogo da macaca! Nunca soube por que lhe deram tal nome, mas logo que aprendeu a equilibrar-se num só pé, foi dos primeiros que aprendeu. Quando era criança, todos os jogos funcionavam da mesma forma: ao ar livre, tirando partido do chão, dos elementos que a natureza oferecia ou dos desperdícios jogados no lixo; poucos, porque o consumismo não se tinha ainda imposto com a força avassaladora da contemporaneidade.
Habituada à imensidão dos espaços que a natureza sempre lhe ofereceu, não compreende como se pode meter um jardim Zen num quadrado de madeira. Compreende ainda menos as explicações que, posteriormente, encontrou na parte debaixo da caixa:
“O Jardim Zen é originário do Japão, onde o budismo Zen tem uma grande influência. Usado como sistema de meditação, o Jardim Zen liberta a mente do stress, pressões e confusão. Os seus componentes são singelos. A areia representa o mar; as pedras a montanha, e o ancinho serve para lavrar o jardim. Pode desfrutar desta antiga tradição cultivando o seu próprio jardim Zen. Ponha-o em casa ou no escritório”.
- É o fim da macacada! – desabafou.
Às crianças tiraram a rua, aos idosos oferecem palmos de jardins empacotados.
Aida Baptista

Apontamentos anticancro 5

«Se todos nós temos um potencial cancro adormecido, cada um de nós tem também um organismo concebido para lutar contra o processo de desenvolvimento de tumores. Cabe a cada um de nós usar as defesas naturais do nosso organismo. Há outras culturas que o fazem muito melhor do que a nossa.
Os cancros que atormentam o Ocidente – por exemplo, o cancro da mama, do cólon e da próstata – são de 7 a 60 vezes mais frequentes aqui do que na Ásia. No entanto, as estatísticas revelam que, comparativamente à dos homens ocidentais, a próstata dos orientais que morrem antes dos 50 anos e de outras causas que não de cancro, apresenta a mesma quantidade de microtumores pré-cancerosos. Existe algo no seu estilo de vida que evita o desenvolvimento destes tumores. Por outro lado, a taxa de cancro em japoneses que vieram viver para o Ocidente torna-se igual à nossa na segunda ou na terceira geração. Há algo no nosso estilo de vida que enfraquece as nossas defesas contra essa doença. Estudos mostram que o estilo de vida tem uma influência fundamental. Todas as investigações sobre o cancro são unânimes: os factores genéticos contribuem, no máximo, em 15% das mortes por cancro. Em resumo, a fatalidade genética não existe. Podemos aprender a proteger-nos».
Do livro «Anticancro – um novo estilo de vida» de David Servan-Schreiber.


terça-feira, 18 de maio de 2010

CICLO REFLEXÃO




O RUFAR DO TAMBOR
1
Ó meu Amor, é para ver tantos abrolhos,
Ó flor sem eles, que tu tens tão lindos olhos!?
Ah! Foi para isto que te deu leite a tua ama,
Foi para ver, coitada, essa bola de lama
Que pelo Espaço vai, leve como a andorinha,
A Terra!?
Ó meu amor! Antes fosses ceguinha...

António Nobre (final do poema A Vida)


2
A Sociedade nas suas diversas componentes - a política, a económica… - orienta os seus recursos para a obtenção de lucro rápido e fácil. A isso chamam avanço tecnológico e progresso económico. A Sociedade inventou uma máquina gigantesca com inúmeros operários especializados. Os que põem a máquina a funcionar numa determinada direcção (os políticos), os que fazem a sua manutenção (economistas, gestores, administradores, doutores e engenheiros) e os que fazem a propaganda da máquina dizendo que a máquina é boa para todos (os órgãos de comunicação social). Estes são os teóricos do Regime e que funcionam como estímulo e fonte inspiradora para os outros. Ora os outros são o «peão das nicas» do Sistema. Os que produzem a energia para a máquina trabalhar e a riqueza que é o produto transformado e acabado.
No tempo da «outra senhora», lembro-me dos inúmeros comboios de mercadorias que viajavam pela linha do Douro preferencialmente de noite para não dar nas vistas. Os ditos comboios circulavam cheios de mantimentos, com dísticos dizendo «Sobras de Portugal». Sendo Portugal como ainda é, um dos países mais pobres da Europa, as ditas «sobras» davam vontade de rir ou de chorar. Conforme a perspectiva. Os governantes daquele tempo vendiam os tais mantimentos aos beligerantes da guerra obtendo grandes lucros. Com a guerra, isto é, com o mal dos outros, os cofres do Estado acumularam grande riqueza, mas o povo continuou a ser o mais pobre da Europa.
Com o advento da democracia tudo mudou para melhor porque para pior era impossível. Mas não vivemos numa sociedade boa porque não é justa na distribuição da riqueza.
Assim, a «exclusão social» continua a aumentar.
A forma de viver condiciona a nossa Vida. O rufar do tambor marca o ritmo do Caminhar. Mas para onde?!...

Errata
Onde se lê «exclusão social» deve ler-se pobreza, pobreza extrema, miséria e fome de tudo.
Paixão Lima
3
Tu, Nobre, cantas a vida
Como quem dela se vai
Como quem sofre e se esvai
E teima em levar consigo,
Agarrado,
Seja amigo ou inimigo,
Quem tanto a Vida seduz.
Deixa ter uns lindos olhos
Quem não tem a tua cruz.
Que a bela não tenha abrolhos,
Seja uma flor entre flores.
E não transformes a Terra
Em bola de lama e trapos.
Deixa a Terra rebolar
Pelos espaços sem fim
Mais leve que uma andorinha.
Tem dó dela e dó de mim,
Não sejas tão pessimista,
Não faças dela ceguinha,
Não sejas tão egoísta,
Não tenhas só de ti dó.
Se queres morrer, morre.
«Só».

André Moa

Apontamentos anticancro 4

«Neste livro, gostaria de contar-lhes as experiências – científicas e pessoais – por que passei e com as quais aprendi.
Após a cirurgia e a quimioterapia, pedi conselho ao meu oncologista. O que deveria fazer para levar uma vida saudável e que precauções poderia tomar para evitar uma recidiva?
- Não há nada de especial a fazer. Leve uma vida normal. Faremos TACs regularmente e, se o seu tumor voltar a aparecer, detectá-lo-emos numa fase inicial – respondeu este prestigiado praticante da medicina moderna.
- Mas não existe um tipo de exercício físico que eu possa praticar? Um regime alimentar a seguir ou a evitar? Não deveria cuidar também do aspecto mental? – perguntei.
A resposta do meu colega desnorteou-me:
- Nesse campo, faça o que lhe apetecer. Nada disso o pode prejudicar. Mas não existem quaisquer provas científicas de que esses métodos evitem uma recidiva.
Os métodos, mais teóricos, relacionados com a mente, o corpo e a alimentação, eram algo que ele não tinha disponibilidade de tempo, ou interesse, para explorar.
Conheço este problema enquanto médico académico. Cada um na sua especialidade, raramente estamos a par de descobertas fundamentais publicadas em prestigiadas revistas como a Science ou a Nature.
Passei meses a investigar até começar a perceber como poderia ajudar o meu organismo a proteger-se do cancro. Participei em conferências, nos Estados Unidos e na Europa, que reuniam investigadores que exploram este tipo de medicina «de acção». Esquadrinhei bases de dados médicas e passei publicações científicas a pente fino.
No seu conjunto, toda a informação científica revela o papel essencial das nossas defesas naturais na batalha contra o cancro».
Do livro «Anticancro – um novo estilo de vida» de David Servan-Schreiber.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

UMA VIDA EM VERSOS

Pedro Miguel e Susana - in illo tempore

AOS SETENTA só SESSENTA DE POESIAANTOLOGIA DE UM DESCONHECIDO
Edição 1973
(continuação)

POEMAS INDEFINIDOS
(continuação)

METAMORFOSE

1
Meta
aqui
META
meta
no meio
AMOR
e
MORFO
meta
na
meta
SE
e
sente
se
2
ponha
na raiva
a espuma
no asco
o odor
na lava
um cacho
na bruma
um licor
na coisa nenhuma
uma causa
uma flor
3
se canto
não coro
se pranto
não choro
se rio
não corro
não paro
não pasmo
retomo
a corrente
navego
entre gente
retorno
ao rio
do futuro
cio
do terno
orgasmo
do eterno
instante

QUERO FUGIR E NÃO DEVO

o dever não me larga
o dever não me deixa
fugir de mim

fica-me a mágoa
resta-me a queixa
até ao fim
de mim

DOS BRAÇOS À TERRA

dos braços
nus
à terra
seca
vão
descer
sementes
que
um dia
irão
florir
se
o homem
as regar
se
o homem
não
dormir

POEMAPA

POVO QUE LAVAS NO RIO
PENEDOS DE FOME E FRIO,
PASSA AS PASSAS.

Apontamentos anticancro 3

«Existe um cancro adormecido em todos nós. À semelhança de todos os seres vivos, o nosso organismo produz constantemente células defeituosas. É assim que surgem os tumores. Mas o nosso organismo também está equipado com mecanismos que detectam e controlam essas células. No Ocidente, uma pessoa em cada quatro morrerá de cancro, mas três em cada quatro não morrerão. Os seus mecanismos de defesa entrarão em acção e elas morrerão devido a outras causas.
Eu tenho um cancro. Foi diagnosticado pela primeira vez há 15 anos. Submeti-me a tratamentos convencionais e o cancro entrou em remissão, mas tive uma recidiva. Decidi então aprender tudo o que pudesse para ajudar o meu organismo a defender-se da doença. Enquanto médico, investigador e ex-director do Centro de Medicina Integrativa da Universidade de Pittsburgh, tinha acesso a informações de valor inestimável sobre métodos naturais para prevenir ou ajudar a tratar o cancro. Há sete anos que o mantenho à distância.»
Do livro «Anticancro – um novo estilo de vida» de David Servan-Schreiber.

sábado, 15 de maio de 2010

CICLO EMOÇÃO












AURORA NO OCASO?

Vivo a sonhar
Os meus sonhos desfeitos;
Já não cumprirei
O quanto sonhei
Realizar...
Hoje, vivem na memória
Como um ente querido
Que se foi!
Fechado na masmorra,
De todos esquecido
Fica-me o propósito
De ter querido o Belo!
Estou extenuado
De tanto porfiar;
Lamentando a minha impotência,
Cumpro a penitência
Em poemas inexpressivos.
Remetido, sem recurso,
Ao ostracismo,
Ainda tenho a coragem
Para não ceder;
Acordo, calmamente,
Na pacífica condição
De quem tudo tentou...
De costas voltadas ao mundo,
Esbracejo a toda a hora;
Escrevo, depois, um novo verso
Falando dum gigante adormecido
Pronto a acordar.
E deixo todos a interrogar-se
Se no ocaso da vida
Sou ainda aurora!

Ernesto Leandro

Apontamentos anticancro 2
«ADVERTÊNCIA
Este livro apresenta métodos naturais para cuidar da saúde, e que podem contribuir para evitar o desenvolvimento do cancro ou para ajudar durante o seu tratamento, como complemento dos meios convencionais (cirurgia, radioterapia, quimioterapia). O seu conteúdo não substitui a opinião de um médico. Não deve ser utilizado para estabelecer um diagnóstico nem para prescrever um tratamento.
Todos os casos clínicos descritos fazem parte da minha experiência pessoal.
Optei por usar uma linguagem simples para apresentar uma interpretação actualizada do cancro e das defesas naturais.»
Do livro «Anticancro – um novo estilo de vida» de David Servan-Schreiber.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

CICLO PAIXÃO

O PRAZER DE VOAR ou O ADEUS AO TÉDIO

Será que tudo isto existe só porque percebo?!
Toda esta cor! Todo este movimento!
O mar revolto e as ondas a baterem;
O céu azul-escuro do horizonte, impreciso e ténue;
Nuvens brancas a planar pelo espaço;
Aves a voar...
Como gostaria de voar; afastar-me da terra;
Passar além dos montes e ver a terra do alto;
Olhar para o céu e senti-lo próximo.
Mas duvido que tudo isto exista.
Os meus sentidos enganam-se e enganam-me.
Perceber não é entender.
Não é explicar.
O porquê das coisas não existe,
Porque as coisas não existem.
Assim...vou à beira-rio...
Estendo-me de costas no fundo do barquito,
Como se fora o meu caixão;
Impelo o barco para a corrente;
Cruzo os braços e relaxo o corpo e o espírito;
Sem preocupações e de cabeça leve.
O barquito estremece, balanceia e move-se;
Sinto-me levado docemente e
Ternamente embalado como bebé a adormecer
No colo da Mãe.
Para onde vai o barquito?!
Indiferente.
Chegar ou não chegar?!
Tanto faz.
O importante é ir.
Fugir ao tédio.
Paixão Lima


Caros amigos,

A partir de hoje, aparecerá à guisa de rodapé de cada novo texto um apontamento anticancro que me foi sugerido pela leitura do livro «ANTI-CANCRO – um novo estilo de vida» de David Servan-Schreiber - médico, investigador e paciente de um cancro na cabeça, há 15 anos. Nasceu em França em 1961. Estudava, investigava e trabalhava nos EUA, quando lhe foi diagnosticado um tumor no cérebro. Neste livro, cuja primeira edição é de 2008, descreve esta sua experiência de médico-doente. Os apontamentos anticancro não serão mais que transcrições parciais desse livro.
Que eles nos ajudem e ajudem a ajudar.
André Moa

Apontamento anticancro 1

«Sempre achei que o único problema da medicina científica está no facto de não ser suficientemente científica. A medicina moderna só se tornará verdadeiramente científica quando os médicos e os pacientes aprenderem a gerir as energias do corpo e da mente que actuam através do vis medicatrix naturae (o poder curativo da Natureza».
(Prof. René Dubos, Universidade Rockefeller, Nova Iorque EUA. Descobriu o primeiro antibiótico comercializado, 1939. Foi um dos organizadores da primeira Cimeira da Terra das Nações Unidas, 1972). Frontispício do livro ANTICANCRO – um novo estilo de vida.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

CRÓNICAS NO FEMININO

Senhoras e senhores,
Excelsas amigas,
Celsos amigos,

É com um enorme prazer que hoje encetamos um novo ciclo neste blogue, cada vez mais colectivo, cada vez mais de todos, com a honrosa e prestimosa colaboração da consagrada e luminosa cronista Aida Baptista que, num dia memorável, uma inspirada cegonha trouxe à Vida, numa casa da freguesia de Pinheiros, concelho de Tabuaço, Alto-Douro, Portugal.
André Moa

CONFISSÕES DE UMA CEGONHA

Nem eu, nem as da minha espécie fomos destinadas a viver rente ao chão e a engolir o pó da estrada. Por isso, tenho a minha casa bem alta, servindo-me do elevador das asas de cada vez que tenho de sair ou entrar. Felizmente, não tenho por perto outros apartamentos que me limitem a vista da paisagem ou se atravessem na rota dos meus voos. Segundo as regras dos planos directores, que estabelecem as nossas relações de vizinhança, somos obrigadas a guardar uma distância mínima umas das outras. Sensata decisão essa pois, numa altura da vida em que a minha merecida reforma me remete para muitas horas de descanso, resta-me a satisfação de poder fruir de um horizonte sem limites de fronteiras.
Noutros tempos, não tínhamos tempo para isso. Vivíamos numa azáfama constante, porque eram raras as famílias que não encomendavam crianças à cegonha, e várias por cada casa, já que era o tempo das famílias numerosas. Como constantemente se formulavam votos de que as horas fossem pequenas, andávamos sempre num virote. Quantas vezes apanhadas de surpresa, quase nem tínhamos tempo de preparar a encomenda. Seguia o que estivesse mais à mão. Também ninguém exigia serviço à lista, nem perguntava se era menino ou menina. O que fosse entregue seria criado com o mesmo desvelo com que se aceitam os ciclos de fertilidade da natureza, com boas e más colheitas.
A esta distância no tempo, e recordando a quantidade de quilómetros percorridos, olho com satisfação para a minha carreira e orgulho-me do profissionalismo com que desempenhei as minhas funções. Existisse ao tempo avaliação de desempenho e estou certa de que teria sido agraciada com uma qualquer comenda.
Pensemos na forma rudimentar como transportávamos as encomendas - embrulhadas numa fralda, em forma de triângulo, suspensa do nosso bico num tosco nó de duas pontas; sem seguro de viagem, nem legislação laboral que nos protegesse das intempéries; sujeitas a um regime da mais completa exclusividade e total disponibilidade, dia e noite, sem direito a pagamento de horas extraordinárias. E, no livro de reclamações não há registo de extravios ou de troca de algum pedido. Entregas antes do tempo, existiram algumas, sem que nos pudessem ser assacadas quaisquer responsabilidades. Nem todas corresponderam a uma antecipação forçada da viagem - para sete ou oito meses -, mas antes a uma mentira envergonhada de quem não tinha tido coragem de admitir que fizera uma reserva, ao arrepio da moral estabelecida.
De um momento para o outro, o país ganhou uma classe que, lentamente, se foi aburguesando. As mulheres no auge da procriação, em requintes de snobismo, deixaram de nos encomendar os bebés para os passar a mandar vir de França. E, como todos sabem, a França é um país que fica muito longe. Uma coisa é atravessar um céu sem curvas nem esquinas, do Minho ao Algarve, ou de Trás-os-Montes ao Alentejo; outra coisa é fazer viagem de ida e volta a França, numa altura em que não havia livre circulação de mercadorias e estávamos sujeitas ao controlo de fronteiras e às barreiras alfandegárias. Ainda por cima, com a possibilidade de, no Inverno, sermos obrigadas a abandonar a auto-estrada celestial para nos desviarmos de nuvens carregadas de fiapos de neve que, de tão fria, podia constipar a encomenda, muito antes de ser entregue. É verdade que não havia directivas a obrigar ao porte de certificado de garantia, nem a um prazo de validade. A nossa reputação, por si, era o maior garante da qualidade dos serviços prestados.
Muitas viagens seguidas levaram a um afrancesamento de certas formas de tratamento. Por isso, passou a ser normal que, em muitas das manifestações de carinho, se afagassem bochechas redondas acompanhadas da simulação de um beijo:
- Bijou... bijou! Meu bijou! Tão lindo que é o meu bijou!
Contudo, anos de encomendas e entregas a partir de França não chegaram para apagar a carga simbólica que a nossa imagem havia firmado. A cegonha continuou a ser a representação iconográfica mais usada para simbolizar os nascimentos - nos cartões-de-visita, nos convites de baptizado, nos álbuns de fotografias, nas molduras, nos berloques das pulseiras e fios, nos bordados dos lençóis e das toalhas, na decoração dos quartos, nos bolos de aniversário. Celebrámos a honra de estarmos presentes em todas as representações do imaginário infantil.
Certo dia, foi decidido que os bebés deixariam de vir de fora. Numa agressiva campanha que pretendia pôr em prática o apregoado slogan de que «o que é nacional é bom», acabou a importação de bebés de França. Estes passaram a ter produção exclusivamente nacional. Para acompanhar esta alteração, e porque a linguagem tem um papel muito forte na vida das pessoas e nas construções sociais, decretou-se que, em português, se passasse a dizer que as mães davam à luz. Algumas mulheres levaram algum tempo a habituar-se a esta nova forma de expressão e muitas houve que mantiveram a teimosia de continuar a dizer que pariam filhos. Não era tão elegante, mas era, de certeza, mais ajustado à realidade.
Foi mais ou menos nessa altura que nós, aves de arribação da família das Ciconíidas, decidimos abandonar os condomínios das árvores, para passarmos a ocupar um estúdio no cimo de um poste de electricidade. Sentimo-nos mais próximas delas, unidas por este cordão umbilical que, de poste em poste, transporta a notícia de mais uma vida que brota sempre que se acende a luz da paixão.
Aida Baptista

sábado, 8 de maio de 2010

CICLO REFLEXÃO

A VIDA PLENA E O MEDO DE SER FELIZ OU A MENINA DANÇA?

Sonhos! Sempre sonhos! E quanto mais ambiciosa e fina é a alma, tanto mais os sonhos a afastam do possível. Cada homem traz em si a sua dose natural de ópio, constantemente segregada e renovada. E, do nascimento até à morte, quantas horas podemos contar preenchidas pelo verdadeiro prazer, pela acção feliz e resoluta?
BAUDELAIRE

O SONHO DE UMA NOITE

Sonhei que estava comodamente instalado na minha poltrona a assistir, muito interessado, a um debate político que decorria na televisão. Para ouvir melhor, desliguei o som do aparelho. Eis senão quando, inopinadamente, começo a ouvir ao longe, um cântico estranho e mavioso que se ia aproximando. Uma voz de mulher jovem cantava apaixonadamente uma canção conhecida e cuja letra era a seguinte:
Eu sou nuvem passageira
Que com o vento se vai...
Eu sou um cristal bonito
Que se quebra quando cai.
Abre-se lentamente a porta da sala e entra suavemente a artista. E que artista, meu Deus! Rosto oval, cabelos fartos e negros, olhos amendoados, corpo alto e bem feito. Cingida numa saia rodada e de folhos multicolores, gingava com graça o rabo, mostrando, generosamente, as suas bonitas e elegantes pernas. Apertava-lhe o peito um pequeno «top» vermelho. Com o umbigo à mostra, um belo umbigo, e decote em trapézio que mostrava, pelo menos, dois terços dos seus maravilhosos seios.
- Queres dançar? Pergunta-me com voz sussurrante.
Precipito-me, célere, em seus braços acolhedores e rodopiamos, freneticamente, como loucos, como crianças, derrubando a mesa do centro da sala, enrugando a carpete, fazendo tombar cadeiras e até um candeeiro de pé alto que, por sorte, não se partiu.
De repente, tudo parou e ela desapareceu, porque eu acordei.

Questionário: - Sonhar é fácil?! O sonho comanda a vida, como diz Gedeão, ou é o contrário? A vida é que comanda o sonho?!
PAIXÃO LIMA

Olha. Baudelaire, acabo de fazer uma retrospectiva a setenta anos de vida e não consigo contabilizar horas daquilo a que tu chamas de “verdadeiro prazer”. Quando muito uns minutos, uns salpicos de tempo preenchidos por aquilo a que prefiro chamar prazer transbordante.
Sei lá o que é um “verdadeiro prazer”! E se um falso prazer nos encher as medidas, rejeitamo-lo? E como rejeitar o que já nos inundou a alma e transbordou para a vida?
Uma coisa me fizeste compreender. Vou tanto pelo sonho, foram tão escassos os instantes de «acção feliz e resoluta» (o “verdadeiro prazer”?) que sou levado a supor que a minha “dose natural de ópio” deve ser cavalar e “constantemente segregada e renovada”. Daí, não precisar de importar qualquer alucinogénio, qualquer outro tipo de ópio. Por esse motivo, serei homem de imaginação, de idealizações, nada inclinado para a acção, para a execução. Conclusão: sou um idiota, não um executivo. A bolsa que o diga.

Olha, Paixão, não sei se sonhar é fácil ou não. Penso que será uma propensão. Ou uma fuga? E uma fuga a quê? Às agruras da vida ou à própria vida? Como vês, à tua primeira questão só sei responder com interrogações. Uma coisa eu sei. Pode não ser fácil, mas é barato sonhar. Quanto menos se alcança, mais se sonha.
Quanto à segunda questão, penso que não é a vida mas as circunstâncias que nos comandam. A nós e aos nossos sonhos. Mas o que será a vida senão um somatório de circunstâncias? Se assim for, poder-se-á dizer que é a vida que nos comanda, que é a vida que comanda o sonho, embora, aparentemente, tudo leve a crer que “o sonho comanda a vida”, como cantou Gedeão. E mesmo que isto não seja verdadeiro, é lindo! Só o sonho faz avançar o mundo, “como bola colorida entre as mãos de uma criança”.
- A menina dança?
- Adormeça primeiro e então falamos.
- E se não sonhamos?
- Não dançamos.
- Mas se não dançamos, não sonhamos.
- Então, em que ficamos?
- Não ficamos, vamos. «Pelo sonho é que vamos». Sebastião da Gama o disse.
- E eu corroboro.
André Moa

quinta-feira, 6 de maio de 2010

UMA VIDA EM VERSOS

Aniversário do Pedro Miguel (terceiro da direita) e do Luís Manuel (1.º da direita, falecido há 30 anos). A Susana, mãe do Luís Tiago, é a terceira da esquerda. O resto é o pessoal das duas turmas. Os que estão de costas são dois sobrinhos já pais trintões. Enfim. Uma vida em versos
e a correr.
AOS SETENTA só SESSENTA DE POESIA
ANTOLOGIA DE UM DESCONHECIDO
Edição 1973
(continuação)

POEMAS INDEFINIDOS

TEMPO SILÊNCIO

tempo de silêncio
de condenação
tempo de solidão

nem um cicio
nem um sorriso
nem um rocio

em tempos condenados ao silêncio
a memória dorme
a razão sofre
o coração chora
saudades
pela liberdade na prisão

SEM ISMOS

haverá um dia em que
sem necessidade de um se
este mutismo
não passe
de mero circunstancialismo
e ultrapasse
o condicionalismo
de qualquer ismo

ESPERANÇA

tentei escrever a verde
uma canção de esperança

a tinta estava seca
o papel ressequido

a ponta dos dedos manchada

a canção perdeu-se
a esperança adiada

UMA ONDA GRITOU ALTO
uma onda gritou alto
esmagou a areia toda

as crianças em sobressalto
esqueceram por instantes a fome
a falta de um lar
a falta de um nome
ergueram castelos
simularam um assalto
brincaram às guerras
deram gargalhadas lindas

SEMI POUCO

semiescas mãos manejam
semiascos de semear homens
no aqui e no agora
sem tecto
sem testo
sem tusto
sem reco
sem resto
sem rosto
sem eco

tão pouco
tão tosco
tão oco

semi esco
semi tosco
semi asco
semi eco
semi reco
semi oco
semi rouco
semi pouco

CREIO NO NATAL DE ALGUM DIA

desde que disseram que nasceu neste dia
o homem embebeda-se e chama-lhe alegria

depois de dizerem que o crucificaram
vem sendo esperado ao terceiro dia

trinchadores de peru e outros que tais
afirmam que já veio: comem cada vez mais

nanja os meninos que não têm seio
nem os poetas que choram por isso

André Moa

terça-feira, 4 de maio de 2010

CICLO EMOÇÃO

RINCÃO NATAL

TABUAÇO!
Magia de divinais belezas,
Contrastantes matizes,
Panóplia de naturas surpresas!
Mas ultrajaram-te, minha Terra,
Por paradoxos infelizes...
Já não bastava a estrada
Há muito sonegada!
Adjacente
Ao afluente
Távora,
Cromossomicamente duriense,
Administrativamente presa
À distante Beira-Alta!
Denegação ao autóctone tabuacense
Dum direito que lhe pertence
Esbulhando-lhe os rios em que se mira...
Serei do Alto-Douro, pese a todos;
Não me revejo nas " Terras do Demo";
Gritarei alto, com coragem a rodos:
Decisão arbitrária eu não a temo.
Conterrâneo, amigo, meu irmão:
Levantemos os olhos para o Marão
E viremos as costas ao granito!
Quem decidiu não nos quis ouvir;
Vamos ainda a tempo de exigir
Que queremos ser autênticos e não mito!
Nossa Terra, de meus irmãos, minha:
Tua aura em nós cresce, não definha,
Que às origens, um dia, voltaremos
Cheirando o húmus que em criança pisei,
Nele semeando um mundo que eu sonhei
Que, agora adultos já não reconhecemos...
Lembro, com saudade, o "Lago" da minha infância:
Ao fundo, Tabuaço, nas narinas a fragrância
Duma natureza que levei ao mundo inteiro!
O Calvário, S. Vicente, S. Plácido, Penedo, Pedregal,
"Estrada do Fradinho", belo-horrível medonho, natural,
O jardim de minha casa onde eu tinha um canteiro...
Minha Terra: São teus todos os versos que escrever;
Em troca, só peço um pedaço de terra escondido
No cemitério onde dorme cada amigo já vivido,
Quando, para sempre, eu decidir adormecer!

Ernesto Leandro

domingo, 2 de maio de 2010

CICLO PAIXÃO









Mais um poeta que nasce ou mais um poeta há muito fechado na concha com poemas engavetados a clamar por serem arejados e postos ao sol? Agora que a gaveta se entreabriu e de lá saiu esta preciosidade, esperemos que outros e outros surjam e venham até aqui brilhar à luz do dia. Há sempre um Paixão Lima capaz de nos surpreender. Ele aqui está. O poeta. Ele que afirma e reafirma que poeta não é. Olha se fosse!
André Moa

UM AMOR QUE SE SENTE E NÃO SE VÊ.

Gosto de ti tal como és
Espontânea flor silvestre
Com cheiro, com cor e com espinhos.
Mas é mais do que gostar!
É sentir-te! É adivinhar-te!
É tocar-te em sonhos e
Realizar meus apetites e fantasias;
Possuir-te para sempre, profundamente...
Ser teu e tu seres minha.
Uno e indivisível, um corpo só,
Duas mentes iguais e
Dois corações batendo ao mesmo tempo,
Numa oferta a um Deus desconhecido.

É ser Sonho, é ser Realidade
Em conjugação.

Mas como passar contigo além do Cabo?! Ó meu Amor...
Paixão Lima
 
Que cantan los poetas andaluces de ahora...