SEJAM MUITO BEM VINDOS A ESTE BLOG!--------ENA!-- TANTOS LEITORES DO MEU BLOG QUASE DIÁRIO! ---ESTA FOTO É UMA VISTA AÉREA DA MINHA TERRA,-TABUAÇO! UM ABRAÇO PARA CADA UM DE VÓS! -ANDRÉ MOA-

DIÁRIO DE UM PACIENTE II

sexta-feira, 30 de abril de 2010

CICLO REFLEXÃO

















A FORÇA DE ACREDITAR COMO CRITÉRIO

DE VERDADE Uma crença forte demonstra apenas a sua força, não a verdade daquilo em que se acredita. Nietzsche Nasce um Deus. Outros morrem. A Verdade Nem veio nem se foi: o Erro mudou, Temos agora uma outra Eternidade,

E era sempre melhor o que passou. Cega, a Ciência a inútil gleba lavra.
Louca, a Fé vive o sonho do seu culto. Um novo deus é só uma palavra. Não procures nem creias: tudo é oculto. Fernando Pessoa (cancioneiro)
A fé existe, mas não é nada. A fé é a verdade individual e o acreditar sem o demonstrar. A humanidade, sempre carente, precisa da fé para se sentir menos infeliz e mais segura. A fé é te
r esperança na recompensa, após uma vida de sofrimento. É o caminhar sofrido para o prémio. É o bálsamo para as nossas feridas. E por causa da fé, e pela fé, e em nome da fé, uma miragem abstracta e sem substância, mata-se e morre-se. Desde sempre. Desde que o homem descobriu a fé. Será que a fé, não sendo a solução, é o problema?! Porque a minha fé é melhor que a tua. A minha fé é verdadeira, a tua não. Que coisa estranha a fé. Até por isso, gostaria de ter fé. Para me sentir confortável e igual à imensa maioria. Para não questionar nada nem ninguém. E ter a ilusão de ser feliz. Para palmilhar o caminho das multidões e para experimentar a paixão de acreditar só por acreditar, como uma necessidade espiritual essencial. Mas só tenho fé no que é perceptível aos meus sentidos. Mas duma coisa estou certo. Mesmo sem fé em nada, não sou melhor nem pior que os outros. Sou igual. Assim, ter fé ou não ter fé é uma falsa questão. Não é fundamental.
Paixão Lima
Quanto mais forte é uma crença mais perigosa ela é. Quem crê não vê, senão com os olhos da fé que é cega.
André Moa

quarta-feira, 28 de abril de 2010

UMA VIDA EM VERSOS

Pedro Miguel e Susana ao colo do tio e padrinho na parte alta do jardim de Angra do Heroísmo atrás da estátua chamada "OPreto"


AOS SETENTA só SESSENTA DE POESIA
ANTOLOGIA DE UM DESCONHECIDO
POEMACÃO (continuação)


TINTA PRETA

- MAMÃ,
Porque será que os meninos
Dos jornais
Têm caras tão branquinhas?
- É da tinta.
C O M E
- mas a tinta dos jornais é preta!
Não será
F O M E?
- Isso não é
Da minha nem da tua conta
- Mas o papá…
- Cala-te e
C O M E
C O M E F O M E C O M E

AMOR COM AMOR SE PAGA
ÓDIO TAMBÉM
riquíssimo amante
de cães e felinos
enxota para longe
da porta os meninos
a quem falta o pão
apenas porque
são filhos de quem
o dito é patrão


CRIME CONSUMADO
NUM «JARDIM À BEIRA-MAR PLANTADO»
linda coisa a instrução
para o filho do patrão

linda coisa a habitação
para o filho do patrão

linda coisa a carne o leite o pão
para o cão o filho e o gato do patrão

linda coisa o ensino da prisão
para o servo do patrão
linda coisa a morte prematura
para aqueles que ao patrão
bom futuro assegura

PREVIDÊNCIA
ai pré
vidência
da previdência

ai caixa
ai baixa

quem paga a taxa?

ai fé
no pré
da morte em pé

caixa
caixão
previdência não
[1]

FUI À FONTE COLHER ROSAS
Interesses senhoriais
Decretaram
o meu fuzilamento
quando ousei
ir à fonte colher rosas
que morriam
de sede e pediam
socorro à fonte
encravada
em interesses senhoriais
guardados a fuzil

pobres rosas!

PORTUGAL DOS PEQUENINOS
pés-lama
peito-osso
doenças sem cama
crianças só barriga
ranho e pescoço
velhos em corpo moço
povo esquecido
ignorado
povo envilecido
explorado
inculto
analfabeto e bruto
povo curvado
a tomar de assalto
a rica Europa
a fugir do país
a salto
povo servil
obediente
romeiro impenitente
permanentemente ajoelhado
junto ao altar
em frente de algum santo no andor
um povo embrutecido
açaimado
por um mitómano
insolente
canhestro
Impertinente
colégio clerical
um misógino cardeal
um megalómano ditador

CARTAZ TURÍSTICO
há sempre um portugal desconhecido
o sol brilha
brilha
brilha
do minho a timor
descubram o algarve
esse primor
praias morenas
moiras encantadas
amendoeiras em flor
gente
valente e dócil
alegre
sorridente
hospitaleira
digna descendente
do nobre povo marinheiro
e navegador
terra de heróis
e de santos
terra de mil encantos
de mil cores
terra de santa maria
altar do mundo
cova da iria
povo eleito
povo honrado e de respeito
povo risonho e feliz
realizado satisfeito
povo que deu
novos mundos ao mundo
e fez seu
onde morreu
o mar profundo

[1] Este poema foi escrito, quando eu, de Previdência, apenas conhecia a espuma, o perceptível à vista desarmada., o mal que dela emanava e era comentado, as filas intermináveis de mães inquietas e filhos rabugentos, desde as primeiras horas da madrugada, à espera de uma incerta e apressada consulta.
Ironia do destino, em 1976, depois de ter sido convidado para o cargo de Presidente de uma Caixa de Previdência, que, obviamente, recusei, ingressei no Sistema de Previdência como técnico superior, donde transitei para o Sistema de Segurança Social, no qual, mantendo o lugar no quadro de técnico superior que percorri de lés-a-lés, cheguei a exercer cargos cimeiros como dirigente. Sempre sustentei e continuo a sustentar que ainda não se encontra implantado o Sistema de Segurança Social criado na Lei Fundamental do país, na Constituição de 1976. Continuamos num sistema híbrido cujos alicerces continuam a ser o do Sistema de Previdência, fundado essencialmente no chamado seguro social que de seguro tem pouco e de social ainda menos. Ninguém me quis ouvir, agora também já começa a ser tarde (até porque já estou aposentado) para continuar a terçar armas a favor da minha querida dama: a Segurança Social constitucionalmente prevista. Bastará ler a constituição como eu a leio. Com olhos sociais. Dela retirando as devidas ilações, com vontade de implantar finalmente o Sistema de Segurança, efectivamente social.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

CICLO EMOÇÃO

DÁDIVA MÚTUA

Abre os braços e agarra
O que te dou
Sem a urgência
De dádivas passadas.
É do poeta que, cansado,
Descansou
De longas caminhadas...
Levantei-me para começar
Um novo poema,
Mas em vão.
Desconsolado, constato
Que estou mais para receber
Que para dar...
Qual a razão?
Ela está no facto
Das rosas que amei
Terem murchado...
Mas grato te bendigo,
Quando contigo
Passo do meu inverno gelado
À Primavera em que te encontrei!

SOFRIMENTO OCULTO

Quando acabar,
Hei-de voltar
Rápido
E aperceber-me onde falhei.
Agora, obtusa a inteligência,
Já só entendo a premência
Em não continuar
Quixotescamente!
Em asmática ânsia
No sofrimento,
Obrigo-me a encobrir
O meu tormento,
Por este desencontro
Com o mundo,
No sorriso que vês
Quando te encontro...

Ernesto Leandro

sábado, 24 de abril de 2010

CICLO PAIXÃO


Feira da Senhora da Hora - Matosinhos - foto tirada em Abril de 2010

A HISTÓRIA DA MINHA IDA À FEIRA
Meu Menino Moa,
Hoje mandaram-me à feira. Não! Não foi à merda. Se não sabes, ficas a saber que na terra onde vivo, na cidade da Senhora da Hora, todos os sábados de manhã, há uma feira importante. A patroa, com as recomendações do costume, faz uma lista do pretendido e lá vou eu com o carrinho das compras para a tal feira. Detesto ajuntamentos e bichas. Se te disser que não fui à Expo 98 só para não sujeitar o meu esqueleto fraco e alquebrado à tortura das bichas, até para cagar…! Mas voltemos à feira. Depois de tamanho feito, de vencer tantos obstáculos, com encontrões, safanões, palavrões à mistura e rompendo o cerco como o Malhadinhas, mas sem pau, lá regresso eu da dita feira, todo ancho (como dizes com graça), arrastando o carrinho cheio de compras. Cheia de zelo, a patroa vai vistoriar a qualidade dos produtos e comparar as compras com o dinheiro gasto. Foi uma tortura inquisitorial de todo o tamanho. Um pouco à semelhança daquilo que, sei lá, praticaste nos tribunais.
- Parece impossível, António! - Admoesta a patroa. - Deixaste-te levar como um tanso, como uma criancinha. Eu não te havia dito que não comprasses a esses que são uns careirões?! Era ao outro! Ao gordo de bigode! Não tens cabeça para nada.
Etc. Etc. Resultado, fui condenado a uns tantos meses de pena suspensa (não ir à feira tão cedo) e rotulado de tonto e de não saber governar a vida, o que eu já sabia. Desta maneira mais ou menos sábia safei-me de, nos tempos mais próximos, voltar à feira.
Um grande abraço, menino Moa. Se continuares a portar-te bem, da próxima vez que for à feira, presenteio-te com um gelado com o sabor a... (ao teu gosto).
Aí está a história da minha ida, não à guerra, mas à feira.
Paixão Lima

quinta-feira, 22 de abril de 2010

CICLO REFLEXÃO



Esta «historinha» é dedicada à Dad.
- Mas porquê a ela?! - Interroga a Laurinha. Porque a Dad, além de ser a Samantha dos computadores e prestar assistência técnica gratuita ao grupo, é muito dada à defesa de causas nobres que muitos esquecem e poucos lembram. Ela não esquece e lembra, lembra sempre.
Paixão Lima

O «FIEL» DE FLORENÇA.

O cão é um animal nobre. Vou contar-vos a história do «Fiel», o cão cuja estátua em memória ainda hoje perdura (pelo menos assim o julgo), na estação ferroviária de Florença.
O «Fiel» acompanhou o dono ao comboio, quando este partiu para a guerra. Todos os dias, o «Fiel» ia à estação, à mesma hora, na esperança de ver regressar o dono. O dono não regressou, porque morreu na guerra. Mas nem por isso o «Fiel» deixou de ir esperá-lo, à mesma hora, todos os dias da sua vida. Até que um dia, o «Fiel» morreu de velho, mas no seu posto, a aguardar o dono.
Como vêem, os cães têm memória e uma capacidade infinita para amar. Para amar até aqueles que não os amam e os maltratam.
Houve uma personagem importante que afirmou: - «Quanto mais conheço os homens, mais gosto dos animais». Eu sou uma personagem sem importância nenhuma, mas nem por isso deixo de afirmar, democraticamente, o seguinte: «Quanto mais conheço os homens, mais gosto das mulheres. Não! Não é só isso. Mais gosto dos cães.»
Paixão Lima
QUANTO MAIS CONHEÇO OS HOMENS MAIS GOSTO DOS HOMENS

Recebi este texto do Paixão Lima, sem indicação precisa se era para o ciclo reflexão, se para o ciclo paixão. Optei pelo ciclo reflexão por dois motivos que são três, quase quatro, senão mesmo cinco ou seis ou mais.
1.º Motivo – Motivo de peso, como facilmente se adivinha - Seguindo a rotatividade que vem de trás, hoje cabe avançar com o ciclo reflexão.
2.º Motivo – igualmente de peso – Este texto do Paixão é ternurento, logo, subjectivo, logo, controverso.
3.º Motivo – De peso insustentável - Li o texto e logo me apeteceu contestá-lo, meter o bedelho onde, porventura não sou chamado.
4.º Motivo – Este meu texto será tão subjectivo quanto o do Paixão Lima, por isso, susceptível de equilibrar a carga e não deixar cair a besta que vai ao colo – o cão.
5.º Motivo – o de maior peso, sem dúvida – A minha relação com a espécie canina sempre foi tensa, pouco amistosa, nada dada a salamaleques ou manifestações de tu cá, tu lá. Comigo é cão lá, Moa cá. Rua, que aqui não é sala de cães.
6.º Motivo (afinal são seis) – Este, não apenas porque será o último, mas porque, de facto, na minha subjectivíssima maneira de ver as coisas, é o mais importante. Também o menos, política e caninamente, correcto, reconheço. Mas que querem, hoje deu-me para aqui, para ser eu o mau da fita…
Sempre me arranhou os neurónios, as aurículas e os ventrículos, quer os da esquerda, quer os da direita, as orelhas e a psique, aquela famigerada e, a meus olhos, triste e repugnante frase que tanto enaltece os cães e rebaixa os homens e reza assim: «quanto mais conheço os homens, mais gosto dos cães». Repudio este conceito com todas as veras da alma. Porquê? Só os cães e os animais abaixo de cão não compreenderão a razão funda da questão. E só por esta razão me parecer tão óbvia, é que não acrescentarei mais nada. Pelo menos por agora. Excepto um sétimo motivo.
7.º Motivo – ele há sempre mais um motivo que nos atropela - O último, mas não o menos importante, bem pelo contrário. Por mim, quanto mais não seja em defesa e por consideração para com a espécie a que pertenço, continuo a amar com todo o corpo, alma e divindade que me restam a mulher; a gostar de todos os homens e mulheres, com paixão e compaixão; a tentar compreendê-los e a ajudá-los, por mais que os seus actos me repudiem e reclamem perdão. E que os cães se mantenham cães a valer e não caniches de alcova, lulus de almofada, bibelôs de carne e pêlo, donos e senhores do lar e dos seus escravizados servidores.
André Moa

terça-feira, 20 de abril de 2010

UMA VIDA EM VERSOS

os meus três filhos em férias - Luís Manuel (falecido), Pedro Miguel e Susana, a mãe do Luís Tiago que hoje tem a idade que a mãe teria aquando desta fotografia.

1 -BOLETIM DE SAÚDE

Hoje tive consulta com o médico de oncologia. Olhou para o relatório da TAC, viu as medidas dos nódulos que aumentaram de volume e sentenciou: «dou-lhe mais um mês». Mais um mês não só de vida, presumi eu, mas de descanso, um mês sem me encharcar de novo em quimioterapia, um mês em que, enquanto a químio vai e vem vem folgarão as costas e todo o corpinho, mais um mês para mostrar o que valho, o que vale a amizade e a onda de solidariedade de que tenho vindo a beneficiar, o que vale o naturista, o que valem os tratamento e os suplementos que experimento há dez meses, o que vale a alimentação rigorosa a que me estou a submeter. Tudo com um fito: vencer o cancro, recuperar a saúde. Disse ao médico que se a TAC evidenciasse que os nódulos tinham desaparecido eu acreditava, ao que ele respondeu: «pois sim, mas eu não acreditava». Falou em mim o desejo e nele a ciência. Calei-me. Calei-me, mas reforçando o propósito de tudo fazer para que neste mesinho o “milagre” aconteça.

2 - AOS SETENTA só SESSENTA DE POESIA
ANTOLOGIA DE UM DESCONHECIDO
POEMACÃO
(CONTINUAÇÃO)

INGENUIDADE CASTIGADA
e o velho cansado dizia:
quase cinquenta anos
sem romper o dia

e mais cansado ainda
perguntava
e repetia:
gostava de saber ao certo
se um velho como eu
não tem direito
a um canto ao sol
a olhar o céu
a viver
alegre e satisfeito
em campo aberto

e já no fim
triste

abandonado
ante a memória do filho amortalhado
cochichava (que as paredes têm ouvidos):
que escuridão
que frio
que ceifar de vidas
sem sentido!

CEGO É O QUE NÃO QUER VER
furaram-me um olho
e não usei tapa
tiraram-me o outro
não deixei de ver
selaram-me a boca
partiram-me os dentes
expresso-me à mesma
e sempre a morder

figas
benfeito
não chegam ao pensamento
desde que a gente não queira
e a gente nunca quer
parem lá com a brincadeira

a gente quer é mostrá-lo
erguer bem o pensamento

o resto é secundário
calvário imposto incluído
B A C A

L H A U


mesa posta à portuguesa
em cada prato uma posta
simples letra morta
do vocábulo apetecido

pouco b-a-c-a-l-h-a-u no mar
tormenta na nau
tempestade em terra
invisível nas lojas
como se fora
agulha em palheiro
tão raro
tão caro
só ouro o atrai

nada no prato

sape gato

oito – dentaduras – oito
aptas a roer espinhas

fome é rabo de peixe a saltar

NO REINO DA ATLÂNTIDA
Aí, tê tê!
Pára aí, têtê!
Pára, I.T.T.
A I.T.T. não pára
Não pára a I.T.T.
Nunca pára a I.T.T.

A I.T.T. quis o Chile
Teve o Chile na mão
Nunca no coração
Teve o Chile na pasta
Teve a “pasta” do Chile
Até que o povo disse:
Basta! [1]
A I.T.T. quis o Chile
A I.T.T. quer muito mais
O milhão é inimigo do mil
Por isso tira
Tira e rouba
Rouba o milho aos pardais

A I.T.T. quer os Açores…
Ai deus i u é
Ai meus amores!

O povo ameaçou e
A I.T.T. - coisa rara -
A I.T.T. recuou
A I.T.T. nunca pára
Foi o povo que a parou
Com a razão
Com a voz
Com a voz da razão
Com os punhos
Com os punhos da verdade

Mas o que isso custou…!
Quanto custou ao sereno
Ao pacífico povo chileno!
Quanto sangue derramado!
Quanto sonho amordaçado!

«Valeu a pena?
Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena»

Pessoa o disse
E é verdade
Verdade como punhos

Povo morto, povo posto.
O Chile morreu
O Chile ressuscitou
O povo venceu
O povo acaba sempre por vencer
«el pueblo unido jamás será vencido»

2
Torre alta Babel
Confusão total
Línguas a granel

Aranha de teias largas
Largas e velhas
Açambarcando o mel
Liquidando as abelhas


CONTRA-LUZ
Fui ao Louvre
Louvre
Fiquei-me
Em Versailles
Versalhei
Vomitei
Nos bidonvilles
Cone-sombra
Da cidade-luz
Extensão da minha terra

[1] ITT - International Telephone and Telegraph Corporation.
1973 - A triste passagem da ITT no Chile é suficientemente conhecida quanto ao financiamento da greve dos caminhoneiros, que foi o ponto de partida para o golpe militar de 1973. O próprio New York Times colheu as denúncias dos repórteres e congressistas, assim como o ...A triste passagem da ITT pelo Chile é suficientemente conhecida quanto ao financiamento da greve dos camionistas, que foi o ponto de partida para o golpe militar de 1973. O próprio New York Times colheu as denúncias dos repórteres e congressistas, assim como o reconhecimento explícito do então presidente americano Gerald Ford sobre a intervenção de seu país no Chile, como forma de proteger "os grandes interesses americanos na região". Mostrar mais
Pela mesma altura, a ITT projectou instalar-se nos Açores com uma produção porcina a grande escala, o que iria transformar aquelas ilhas dos amores numa grande pocilga. E lá se iria a grande riqueza dos Açores – a doçura e a beleza das paisagens; o remanso e a tranquilidade, a fragrância, a pureza dos mares e os bons ares.

domingo, 18 de abril de 2010

CICLO EMOÇÃO



CRENÇA NA UTOPIA

Daria toda a minha riqueza,
Se a tivesse,
Numa dissipação nunca vista!
Fá-lo-ia com toda a inteireza
E, se pudesse,
Seria de todo o indigente o avalista...
Dá Deus as nozes, é verdade...
Mas a minha nogueira não cresceu!
Só me cresce toda a infelicidade
Do poeta inato, inapto como eu...
A sentir saudades do que nunca possuiu,
A criar amor sem ninguém para o dar,
A sonhar os sonhos de quem não dormiu,
A pedir ao pobre para se não calar.
A viver em noites envergonhadas dos dias,
A morrer, chorando contigo, meu irmão,
A preencher o nada de vidas vazias,
A multiplicar o que divido em profusão!
A somar aos pobres o que lhes subtraem,
A consolar os que nada têm, que roubados,
A ser ladrão do ladrão dos desgraçados,
A verberar, pois, contra os que os traem!

Juro!
Os meus versos rasgaria,
Os poetas renegaria,
Às minhas mãos morreria
Se visse modificado
O Universo:
O homem gregarizado,
Irmanado,
E não disperso...

Então, gritaria como nunca ouvistes:
"Ecce Dei" - "Mea Culpa" - afinal, existes!

Ernesto Leandro

sexta-feira, 16 de abril de 2010

CICLO PAIXÃO

QUE VIDA!

1 – Boletim de saúde
Recebi hoje o relatório da TAC efectuada no passado dia 29 de Março. Os nódulos pulmonares teimam em crescer. Significa isto que a guerra nos bofes continua acesa e sem tréguas à vista. Significa isto que se digladiam, há anos, dois teimosos de alto lá com eles: um cancro renitente e andarilho e um triste homúnculo agarrado à Vida que nem lapa à pedra. Isto para dizer que a luta continua, cancro para a rua. Ou para as profundas dos infernos das caranguejolas. E que eu continue a viver em paz e sossego por muitos, saudáveis e bons anos. E convosco sempre a meu lado. Amen
Abreijos
André Moa

2 - De barriga para o ar
Estou de barriga para o ar, refastelado na cama. Não estou cansado nem doente. Mas sinto-me bem. Os músculos em repouso proporcionam um certo relaxamento agradável. A música da M.80 embala docemente, como barco à deriva no mar ao sabor das ondas e correntes, o meu sentir neste momento. Sinto-me envolvido num certo encantamento, sem explicação. Levemente, com os pés, acompanho o ritmo duma música conhecida. Sinto-me bem, sem me sentir bem. Algo falta ao conjunto que criei para ser um momento perfeito do abstracto da abstracção.
A Lira salta para a cama. Procura a minha companhia e, graciosamente, põe-se também de barriga para o ar para que a coce, o que muito aprecia. Distraidamente, faço-lhe a vontade, e começo a coçar-lhe a barriguinha. Ela ronrona de satisfação, como se fosse um gato. O ser ou não ser gato, para ela, é indiferente. Pela janela, observo a paisagem do costume. As mesmas aves a voar, as mesmas pessoas a passar. Hoje, igual ao que foi ontem e ao que será amanhã. Nada muda, nada mudará. Sinto-me ligeiramente entediado. Procuro respostas às perguntas e não encontro nada. O meu porquê caiu no vazio e no esquecimento. Procuro o sentido das coisas. Mas que sentido e que coisas?! Porque nasci, vivi e morri. Porquê e para quê?! Qual o objectivo final de tudo isto que, sendo tudo, tudo, afinal é nada?!
Começa a doer-me a cabeça. Não há dúvida que pensar demais faz mal à saúde. Levanto-me e vou ao Norteshopping. Se com os olhos também se come, com os olhos também se pensa. É forma inteligente de dar descanso aos neurónios.
Assim, contente da vida, mas sem saber ao certo que vida, lá vou ver a paisagem e as bonecas que compõem a paisagem, como as flores no prado. Tanto mais agora que o tempo aqueceu e as flores começam a desabrochar.
E assim se passou um dia da nossa vida, da forma habitual. Nem bem, nem mal.
Paixão Lima

quarta-feira, 14 de abril de 2010

CICLO REFLEXÃO 4


A Ansiedade do tempo

«O desperdício do tempo é, assim, o primeiro e o principal de todos os pecados. A duração da vida é infinitamente curta e preciosa para se estar seguro da própria salvação. A perda de tempo por meio da sociabilidade, da conversa ociosa, do luxo, e até mesmo do sono além do necessário para a saúde, seis a oito horas no máximo, é merecedora da mais absoluta condenação moral. (A ética puritana) ainda não sustenta, como fará Franklin, que «tempo é dinheiro», mas a proposição é tomada como verdadeira num sentido espiritual. Ela é infinitamente valiosa porque cada hora perdida é perdida para o trabalho pela glorificação de Deus».
(WEBER )

Não concordo com o tempo de Weber. «Desperdício do tempo» é o «principal pecado». Mas que desperdício e pecado são esses?! Fala na «própria salvação». Mas salvação de quê e para quê?! Cita a «ética puritana», o que pressupõe a existência de outras éticas. E a citação acaba com a elevação do «trabalho, pela glorificação de Deus». É o discurso dum religioso, influenciado pela Fé, do acreditar só por acreditar. Respeito todas as religiões porque, no fundamental, defendem os mesmos valores éticos. Divergem entre si, apenas na simbologia e no ritual. Mas toda a religião é movida pela Fé, o motor só visível para os crentes. Toda a religião, na sociedade organizada, é precisa, para os que carecem de ser regulados e moderados, nos seus impulsos naturais. Toda a religião indica um caminho estabelecido e pré-determinado, orientado com setas de sentido obrigatório, de vias de sentido único, de sinais de stop, de vias com prioridade sobre as vias que a não têm, etc. Quem não cumprir, vai preso.Mas voltemos ao tempo pois, pelos vistos, temos falta dele. O medidor do tempo é o relógio. Dando a impressão que o tempo pode ser manipulado. Atrasando, parando ou adiantando o relógio. Tudo isto, não passa duma discussão académica, filosófica e até virtual. Como o próprio tempo.Haverá racionalidade nesta reflexão?! Algumas vezes é agradável perder a razão, ou não?! E o que é a razão?!...
(Paixão Lima)



Antes que perca a razão
Com tamanha reflexão,
Vou já dizer o que sinto.
Gosto muito de pecar,
De tempo desperdiçar
Sem entrar no labirinto
Que Max Weber engendra
E acaba em reprimenda
A quem não cumpra um dever
E desperdice à toa
O tempo como Pessoa,
Por nisso sentir prazer.
Não, Weber, eu não baralho,
Desperdício com trabalho,
Ética, deus, alegrias.
Abomino os puritanos
Com os seus ritos arcanos
Que nos dão cabo dos dias.
O que tu querias sei eu!
Criar promessas no céu
Para quem chora e berra
Por trabalhar, nada ter,
Passar a vida a sofrer
Neste inferno que é a terra.
Inferno para quem labuta
E céu para os filhos da puta?
Isso não, amigo Weber.
Que a terra te seja leve.
(André Moa)

«Ai que prazer /não cumprir um dever» - proclamou Fernando Pessoa no seu célebre e bem conhecido poema «Liberdade»

segunda-feira, 12 de abril de 2010

UMA VIDA EM VERSOS




os meus filhos Pedro e Susana - in illo tempore

AOS SETENTA só SESSENTA DE POESIA

ANTOLOGIA DE UM DESCONHECIDO
(continuação)

POEMACÃO*
POEMACÃO

quando a todos for dado o seu quinhão
abaixo o poemacão

de novo os poetas serão
animadores de salão

mas por ora não
ão
ão
ão

p ão
p ão
p ão

pão ão-ão ão
pão ão-ão ão
pão ão-ão ão


PELA FUGA SE DESCOBREM

no tempo poema/modo
de ser estar permanecer
o apoeta dorme
ou passa ao largo
do compromisso
e o crime é pior

o que era sono
passa
a impudor
traição
abandono
HÁ ÍNDIOS E ÍNDIOS

antigamente eram os índios
eram os índios coleccionadores
de escalpos escalpelos
crânios e cabelos
artistas em êxtase
montados em capachos
a contemplar troféus

esses índios eram
circunscritos
limitados no tempo e no espaço
não cometeram feitos
não proclamaram fastos
digamos ruidosos
para subir ao palco da história

mas ficaram na história
esses índios de outrora
para biombo muralha
dos índios modernos
dos gringos de agora

QUASÍMODO

ao Manuel António Pimentel**
um quase nada de suspirar pensamento,
areias movediças para dançar pés-de-vento.

um quase nada de arriscar amor aos outros,
direito a selo: vermelhos marotos.

um quase nada de dignidade por dentro,
processo mil folhas de enrolar um cento.

um quase nada de apostar na verdade,
vermes mercenários roem à vontade.

um quase nada quase o homem todo,
um quase quase quase Quasímodo.


PERSONAE NON GRATAE

não usa gravata
persona non grata

se veste de trapo
criminoso nato

se é refilão
vai já para a prisão

se não diz amém
é filho da mãe

e se for à luta
é filho da puta

quem não bebe à mão
é filho de cão

homem que não chora
não mama
não come

que morra
de fome
** O Manuel António Pimentel, padre Católico, doutorado em direito canónico, em Roma, professor no Seminário de Angra do Heroísmo, certa noite, assistiu, por acaso, à passagem de dois polícias a levar para a esquadra um pobre graciosense, a pontapés e empurrões. Indignado, no dia seguinte escreveu um pequeno texto na União – jornal diocesano – a denunciar a ocorrência. Foi-lhe, por isso, instaurado um processo judicial, foi julgado, embora, no final, tenha sido absolvido, por falta de animus injuriandi, de dolo, de intenção de injuriar a instituição policial. Era este o crime pelo qual fora acusado. A mim, amigo do peito do Manuel António, para além de o ter aconselhado enquanto decorreu o processos, se calhar covardemente, saiu-me apenas este poema que, evidentemente, lhe dediquei. Ainda assim, ele gostou e mostrou-se comovido e grato.
André Moa

* POEMACÃO – O segundo livro da Antologia de um Desconhecido que agora começa a ser para aqui trasladado aos poucos.





sábado, 10 de abril de 2010

CICLO EMOÇÃO

Capela românica do Sabroso-Barcos
-Tabuaço. Foto Osvaldo ribeiro

RENASCER

Desde que me conheço,
Rejeitei sempre a mordaça;
Eu nunca fui quem pareço
Nem sou igual a quem passa!
Sou pobre por opção,
Sou pecador por acção
E um santo como os demais;
Refugo de ricos crónicos,
Estou no rol dos anacrónicos
Com anátema de anormais...
Sou refrigério de quem sofre,
Poeta da minha estrofe,
Sou a Bíblia dum ascético,
Um paladino do ético!
Eu já não desejo nada;
Caminho na minha estrada
Feita pelas próprias mãos;
Já não sinto a bofetada
Que a cara está macerada
De tanto roçar nos chãos...
O cedo para mim foi tarde
Por dele tanto esperar,
Sou labareda que arde
E que nada faz queimar;
Sou lobo, ainda que cordeiro,
Procurando um feiticeiro
Que me prediga o futuro;
Estou certo que vai dizer
Que são horas de eu morrer,
Que o meu futuro é escuro;
Eu já me esqueci de mim
E dos demais, outrossim!
Sou fantasma duma vida
Que não fez a despedida.
E fantasma está calado
A ver os outros viver.
Vem, amor, para o meu lado
E ajuda-me a renascer!

Ernesto Leandro

NO ANIVERSÁRIO DE MINHA MÃE E DE MINHA FILHA

Parabéns às aniversariantes, Susana e tua Mãe. Um beijinho para ambas. Votos de um dia alegre e feliz. Ao “maior” (o maior é o Luís Tiago, o meu neto), artista já maduro e lúcido, envio um abraço. Um grande Abraço.
Ernesto Leandro

Li este comentário no Post anterior e então ocorreu-me abrir aqui uma brecha para homenagear duas mulheres que muito estremeço: a minha mãe que hoje perfaz noventa anos e a minha filha que hoje faz quarenta. Com muita ternura, parabéns, minha querida mãe e minha querida filha.

MINHA MÃE

Minha mãe é velha?
Velha ela não é.
Faz boa parelha
Com o filho Zé.

Minha mãe é velha?
É nova e fina.
É vistosa e bela
Como a filha Vina.

Minha mãe é velha?
Não. É bisavó.
Dá-lhe riso e trela
O seu filho Tó.

Minha mãe é velha?
Mais nova que a brisa
Sob o manto, a telha,
Do Artur, da Isa.

Minha mãe é nova.
A vida é que é fel.
Há muito que chora
O Artur Manuel,

Dois netos, seu homem,
Quatro seus amores.
Perdas que a consomem
Bem mais que outras dores

Minha mãe é nova
Para os seus dilectos.
Netos teve nove.
Já tem seis bisnetos.

Minha mãe é velha?
É velha uma ova!
Eu gosto de vê-la.
Mais que a muita nova.

Minha mãe é nova
Como sempre foi.
Velha só a coxa
Que tanto lhe dói.

Minha querida mãe
Muita dor aguenta!
Quantos anos tem!?
Apenas noventa.

Termino esta trova,
Minha querida mãe.
Quer vente, quer chova,
Quero vê-la aos cem.

Daqui a dez anos
Quero vê-la, mãe,
Sondar os arcanos
Que a vida contém.

Até lá, que viva
Como sempre quis:
Saudável, altiva,
Alegre e feliz.

Do seu José Guilherme
O seu filho primogénito.
Um grande Beijo

MINHA FILHA

A minha querida filha,
A minha bela Susana,
Teve por berço uma ilha,
Desde o parto que é praiana.

Minha filha faz quarenta!?
Se ainda há dias nasceu…!
Não queria tantos, lamenta.
Não querias, filha? Nem eu.

Os que temos, filha, são
Jóias do nosso tesouro.
Quantos mais ainda virão?
Não sabemos. Serão ouro.

A vida não tem idade.
Quantos mais anos, melhor,
Plenos de felicidade,
Paz, alegria e amor.

Tudo de bom te desejo.
Tudo de bom para ti espero.
Minha filha, um grande beijo.
Nem sonhas quanto te quero!

Pai





quinta-feira, 8 de abril de 2010

A VIDA NÃO EXISTE / ELEVAÇÃO PELO VINHO













A VIDA NÃO EXISTE / ELEVAÇÃO PELO VINHO
Há doenças piores que as doenças,
Há dores que não doem, nem na alma
Mas que são dolorosas mais que as outras.
Há angústias sonhadas mais reais
Que as que a vida nos traz,
há sensações
Sentidas só com imaginá-las
Que são mais nossas do que a própria vida.
Há tanta coisa que, sem existir,
Existe, existe demoradamente,
E demoradamente é nossa e nós...
Por sobre o verde turvo do amplo rio
Os circunflexos brancos das gaivotas...
Por sobre a alma o adejar inútil
Do que não foi, nem pode ser, e é tudo.
DÁ-ME MAIS VINHO,
PORQUE A VIDA É NADA.
(Fernando Pessoa)
NADA, NÃO EXISTE,
A VIDA É NADA.
A VIDA NÃO EXISTE.
- Espera Homem! Não te precipites!
Lembra-te que pensas... - Pois penso!
Que não existo.
Ó Tonicha! “
Ora zumba na caneca
Ora na caneca zumba
O diabo da caneca
Toda a noite catrapumba”.
(Paixão Lima)
«Gostaria de chegar aos oitenta anos,
pois, se assim for,
ainda tenho direito a beber mais dez pipas de vinho,
para poder juntar às cem que já bebi.
Não se riam! Façam as vossas contas e verão.»
(Joaquim Arranca)
(no livro inédito - Memórias de um Homem que nunca foi Menino)
EVOÉ*

Evoé! Evoé!
Gritavas em silêncio,
Enquanto degustavas,
Encostado ao balcão,
Em descontraída pose,
O costumado copo
Do vinho apetecido.
Ali fotografado “em flagrante delitro”
**
Anunciaste à gente
A tua morte prematura por cirrose.

Os versos que deixaste de escrever!
Ainda assim legaste
Beleza e poesia quanto baste
Para nos embebedar.

Os teus versos embriagam muito mais
Que a mortal bebida que tomaste
E bem cedo te levou.

Pouca gente te chorou.

Agora és aclamado em toda a parte
Por muita e boa gente rendida à tua arte.

Também eu, por ti embriagado,
Aqui te evoco evocando Baco
O deus do vinho
Nestes versos meio em desalinho
Que não valem mais que um pataco:
Evoé, Baco, Evoé!
Evoé, Poeta, Evoé!

(André Moa)

*Evoé – grito que se soltava durante as orgias, em honra de Baco ou Dionísio, deus do vinho.
** “Em flagrante delitro” – legenda escrita por Fernando Pessoa numa foto que o mostra encostado ao balcão de uma taberna com um cálice na mão.

terça-feira, 6 de abril de 2010

UMA VIDA EM VERSOS

foto da época - Susana, Pedro Miguel, Teresa e Necas, o meu irmão mais novo que morreu há 30 anos, vítima do acidente de viação de que falarei adiante, que também vitimou os meus três filhos, tendo o Luís Manuel, o mais novo, morrido também

AOS SETENTA SÓ SESSENTA DE POESIA - 10


ANTOLOGIA DE UM DESCONHECIDO (continuação)


CANTATA DA PAZ EM DÓ MENOR (continuação - últimos poemas deste primeiro livro da Antologia de um Desconhecido)



15.º andamento – “”mosso”
ADEUS LUA DOS POETAS
[1]
a lua é fóssil
a terra é odre
à lua vai-se
a terra é guerra
a lua é cheia
a terra esvai-se
a lua é lua
a terra é rua
a lua é nua
a rua sangra
a lua U.S.A.
na terra abusa
a lua é TASS
na mesma face
a rua espuma
raiva capaz
de lançar à lua
três bofetadas:
paz
paz
paz
****
16.º andamento – “allegro moderato”
“fortissimo”

QUE LEVE É A NEVE
[2]

batem forte
fortemente
a valer
cacetete não é neve
e é de homem não bater
*****
17.º andamento – “vivace”


O TEMPO NÃO É DE RISO
não obrigues teu filho a sorrir
tão triste em tão tenra idade
falta-lhe o jeito
a espontaneidade
morde-lhe nos lábios
o sangue a fluir
tão sem razão
tão contra vontade
*****
18.º andamento – “allegro”

A SUPREMA ALIENAÇÃO
já foi raio foi trovão
nuvem sol lua foi vento
cobra lagarto dragão
boneco céu passatempo
fantasia arrepio
saraiva chuva metal
fonte oceano mar rio
mostrengo universal
foi guerreiro foi tirano
manda-chuva ditador
mongol hebreu ariano
foi pedra árvore flor
foi uno binário trino
quadrúpede ideia fogo
fortuna sorte destino
força bruta pedagogo
taumaturgo vingador
fulgor eterno avantesma
sempre outra coisa e a mesma
…………………………….
só nunca foi o que interessa
homem dos pés à cabeça
do seu destino senhor
em verdade e em amor
*****
19.º andamento - allegro vivace”

A RAIVA UNIVERSAL
o coro é grande
alinha e canta
é a raiva universal em marcha
a humanidade a acordar
da milenar letargia
é o galo a anunciar
nova alvorada
outro dia
não te esquives ao frémito da aurora
não renegues a pele
o osso
o sangue
os dentes
não te esqueças de que és homem
chegou a hora de em homem te tornares
de mãos dadas com outros homens
mãos de boa vontade
semeando paz na terra
André Moa
[1] Corria, cinzenta e parda, a década de 60. EUA e URSS ensaiavam a guerra das estrelas. Ambas se esfalfavam para conquistar, em proveito próprio e exclusivo, a lua. Os povos que continuassem a suspirar pela paz. Os poetas que continuassem a entoar loas à lua, enquanto as duas superpotências tudo faziam para violar em primeiríssima patada o apetecido corpo iluminado, o romântico espelho celeste.
[2] Cá por casa, a polícia continuava a malhar forte e feio na malta, em tudo quanto era gente de paz e de bem e teimava em manifestar-se contra a guerra colonial, ainda que encapotadamente, contra a guerra do Vietname, antes das manifestações nos EUA que precipitariam o fim da guerra, e ousava mostrar a sua indignação pelo triste estado de coisas a que isto chegara e continuava. E prendia arbitrariamente, e rapava cabeças, e torturava, e matava, e castigava a estudantada com a ida forçada e a destempo para uma das frentes de batalha.

domingo, 4 de abril de 2010

CICLO REFLEXÃO 2


PAIXÃO, AMOR, SEXO, AMIZADE
O amor, enquanto afeição humana, é o amor que deseja o bem, possui uma disposição amigável, promove a felicidade dos demais e alegra-se com ela. Mas é patente que aqueles que possuem uma inclinação meramente sexual não amam a pessoa por nenhum dos motivos ligados à verdadeira afeição e não se preocupam com a sua felicidade, mas podem até mesmo levá-la à maior infelicidade simplesmente visando satisfazer a sua própria inclinação e apetite. O amor sexual faz da pessoa amada um objecto de apetite; logo que possuída e saciado o apetite, é descartada «tal como um limão sugado».
KANT
Reflexões sobre este texto, neste momento. O pensamento humano não é estático, move-se. Amanhã, poderei ter uma opinião não coincidente com a que manifesto agora.
No século XVIII, o Kant kantava, agora não. Como conceber o amor, sem sexo?! Sem troca de sensações e emoções?!. Sem o conceber?! Sem o dar e o receber?! Não é, por acaso, que denominam o acto sexual de fazer amor. Será, a meu ver, inverter o conceito de amor, transformar o acto sexual numa necessidade fisiológica como outra qualquer.
O «limão sugado» é um conceito errado. No amor não se esgota o limão. Com o tempo, ele tende a dar menos sumo, mas enquanto der, nem que seja uma só gota, o amor completa-se. Não sendo possível o acto sexual, pode amar-se com a mesma intensidade. Para isso basta ter imaginação e criatividade. É o cérebro que comanda o universo dos sentidos.
Não há inclinação meramente sexual, como diz o Kant. Só se deseja o que se ama.
O filósofo contradiz-se, quando afirma: «O amor sexual faz da pessoa amada um objecto de apetite». A isso, chama-se paixão. A concepção do amor é o maior prazer que os nossos sentidos reconhecem. Só assim se compreende a perpetuação da espécie. Se o acto de conceber fosse desagradável, acabaria a vida na terra. Logo, o amor é vida.
Pode existir amor sem sexo? Pode, mas não é a mesma coisa.
Paixão Lima
PAIXÃO, AMOR, SEXO E AMIZADE
Se me consumo em labaredas sou paixão.
Se ardo em lume brando sou amor.
Se ao meu corpo uno teu corpo sedutor
Em fervoroso amplexo,
Até à lassidão,
Eu sou amor e sexo.
Se amo sem olhar o corpo de quem amo
E se esse amor não tem idade,
Pouco importará como me chamo.
Serei ainda amor, e chamo-me amizade.
André Moa

sexta-feira, 2 de abril de 2010

CICLO EMOÇÃO

na foto: rio Douro e quintas de Adorigo-Tabuaço, terra natal da mãe do Ernesto Leandro

A MINHA MÃE

Minha querida Mãe:
Na mesa-de-cabeceira,
Bem à minha beira,
Um jarro de flores
E o teu retrato
De mulher quando jovem.
Entrego-te as minhas dores
Com o recato
Que me ensinaste tão bem!
De manhã e à noite.
Tu vês-me, com certeza,
Na tua inefável beleza
Com olhos iguais aos meus;
Falo contigo calado,
Limpo o vidro embaciado,
Crendo que estás com Deus!
Tu bem sabes, minha Mãe,
Que na vida sou " Pedro Sem",
Que ela foi sempre madrasta;
Sinto que sofres por mim,
Porque acreditas que é assim
Essa solidariedade me basta;
Aprendi a descodificar
O teu silêncio, a decifrar
Tudo o que tens para dizer!
Os meus irmãos? Estão bem,
Mas com saudades também,
E o Pai que está a fazer?
Junto de ti, certamente,
Quando foste, andou ausente
Longe de todos, a sofrer;
Não tardará que nos vejamos
Para revelarmos o que, agora, calamos,
E ficaremos juntos, quero crer!
Entretanto, Mãe, fala comigo,
Que o teu filho é um poeta em perigo,
Que sê-lo-á até ao fim;
Se não puderes falar, deixa, Mãe,
Pede por mim, saberás a quem
Do mesmo jeito quando eu menino...
Desiludido,
Conto contigo,
Que sejas a dona do meu destino!
Minha Santa, fica bem,
Beija meu Pai, minha Mãe!
Ernesto Leandro
 
Que cantan los poetas andaluces de ahora...